Marcos de Vasconcellos blog

Ligando os pontos

Textos de Marcos de Vasconcellos, jornalista, CEO do Monitor do Mercado, colunista da Folha de S.Paulo e assessor de investimentos.

Estrangeiros entraram na Bolsa com vontade, mas quem conhece o Brasil, saiu

A semana foi de uma euforia peculiar no mercado financeiro brasileiro. A Bolsa encerrou seu terceiro pregão consecutivo em alta nesta quinta-feira (27), com o Ibovespa, principal indicador do nosso mercado, acima dos 112 mil pontos. Coisa que não se via desde outubro do ano passado.

icone de relogio 28/01/2022 09:23

A semana foi de uma euforia peculiar no mercado financeiro brasileiro. A Bolsa encerrou seu terceiro pregão consecutivo em alta nesta quinta-feira (27), com o Ibovespa, principal indicador do nosso mercado, acima dos 112 mil pontos. Coisa que não se via desde outubro do ano passado.

Em outubro, o cenário era a pandemia arrefecendo com o avanço da vacinação ao redor do mundo e um otimismo com a volta à “normalidade”. E hoje? O que leva o investidor a acreditar no mercado brasileiro?

Uma melhoria no mercado de ações mundial não é. Enquanto o nosso Ibovespa subiu 7,09% desde que o ano começou, o S&P 500, que reúne as maiores empresas das bolsas dos Estados Unidos, afundou 9,8%.

O mercado norte-americano está reagindo à decisão do Federal Reserve (Fed), o banco central dos EUA, divulgada nesta quarta-feira (26). Em resumo, a maior economia do mundo anunciou que vai parar com as injeções de dinheiro no mercado (feitas pela compra de títulos) em março. E indicou que pretende aumentar os juros a partir de então.

O resultado mais óbvio disso é a fuga de investimentos os EUA. Como você já deve saber, os títulos da dívida pública americana são considerados os ativos mais seguros do mundo. Se pagarem minimamente bem (com o aumento dos juros), não haveria razão para arriscar o bolso em outra coisa. A não ser para aqueles que topam um risco bem maior, em troca da possibilidade de altos retornos.

Esse tem sido o caso de grandes investidores estrangeiros — os que efetivamente comandam o ritmo do nosso mercado de ações. Do dia 3 ao dia 25 deste mês, os investidores estrangeiros aumentaram sua posição na Bolsa brasileira em R$ 22,9 bilhões. Eles foram responsáveis por 27,8% das compras de ações no período — e por 25,5% das vendas.

Para ter uma dimensão do peso dos estrangeiros no nosso mercado, basta entender que em segundo lugar no ranking de movimentações financeiras ficam os investidores institucionais (como bancos, corretoras e fundos de pensão), cuja fatia nas compras deste ano foi de 12,1%.

Mas isso não significa que os donos do dinheiro mundial enxergaram, de repente, belas perspectivas para a economia brasileira. Com um Orçamento prevendo o menor investimento público da história — sem falar no aumento exponencial no valor destinado a emendas parlamentares —, o ano eleitoral promete muito pouco para a economia real. A explicação está no resto do mundo.

A proximidade de um aumento dos juros americanos balançou as economias mundiais. A sangria afetou imediatamente setores de tecnologia, varejo e grandes importadores.

Além disso, a ameaça de eclosão de uma guerra na Ucrânia gera muita insegurança na Rússia, mercado emergente importante, e eleva os preços do petróleo, cujo barril acaba de atingir o maior valor em oito anos.

É preciso levar em conta, ainda, a expansão da economia da China (com redução de juros), principal destino das nossas exportações. E o que exportamos? Soja, Minério de Ferro e Petróleo, praticamente.

Assim, olhando o cenário mais amplo, dá para enxergar por que investir em petróleo e ferro no Brasil parece uma boa ideia. Foi assim que as ações da Vale (VALE3) e Petrobras (PETR4) subiram, respectivamente, 8,3% e 16,47% neste ano.

Essa alta em dois ativos pode passar a impressão de que nosso mercado está de vento em popa enquanto o mundo afunda, porque, veja só, mais de 27% do Ibovespa são ações da Vale e da Petrobras. Com a atual alta dos dois papéis, ainda que todas as outras ações do índice estivessem em queda, deixaria ele positivo. E esse é o índice que a gente usa para dizer se o mercado está indo bem ou mal.

Assim, apesar das altas consecutivas, a hora é de cautela. Um levantamento feito pela Bloomberg recentemente mostra o Brasil mais vulnerável ao arrocho anunciado pelo Fed do que outros emergentes, como México, Chile e Índica.

Vale notar que, ao mesmo tempo os investidores estrangeiros deixaram quase R$ 23 bilhões a mais aqui neste ano, os institucionais (nossos bancos e corretoras) tiraram mais de R$ 20,5 bilhões do mercado. Quem olhou de fora quis entrar, mas quem é de dentro, saiu.

*Marcos de Vasconcellos é jornalista e assessor de investimentos. CEO do Monitor do Mercado, escreve às sextas-feiras na Folha de S.Paulo, sobre investimentos.

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