O site de notícias Observatório da Mineração publicou uma reportagem em que revela que Marcelo Sampaio, que ocupara o posto de ministro da Infraestrutura do governo Jair Bolsonaro de março a dezembro de 2022, acaba de assumir o cargo de diretor de Assuntos Regulatórios da mineradora Vale.
A Comissão de Ética Pública da Presidência da República, controlada por indicados do ex-presidente, liberou Sampaio e outros três ex-ministros de Bolsonaro a atuarem na iniciativa privada, inclusive sem cumprirem a quarentena mínima de 6 meses, como prevê a lei. Esse processo de espera, previsto por lei, oferece aos ex-integrantes do governo um salário por seis meses sem trabalhar com o intuito de evitar situações de conflito de interesse. A informação foi revelada pelo Estadão.
Marcelo Sampaio é genro do general Luiz Eduardo Ramos, ex-ministro da Secretaria Geral da Presidência, da Casa Civil e da Secretaria de Governo de Jair Bolsonaro. Segundo o veículo, Ramos teria sido autorizado a receber salário de R$ 40 mil até junho.
Ainda segundo relato do Estadão, a Comissão de Ética admitiu que Sampaio tinha “informações privilegiadas” do governo. Mas o liberou da quarentena sob a justificativa de que há “impedimento do consulente a qualquer tempo, e não apenas nos seis meses posteriores ao desligamento do cargo público, de divulgar ou fazer uso de informações privilegiadas.”
A mineradora brasileira, entre as maiores do mundo, possui vasta rede de infraestrutura e logística espalhada por todo o Brasil.
A chamada porta giratória de Sampaio quando agentes públicos vão trabalhar na iniciativa privada em áreas que o seu emprego anterior oferecia acesso privilegiado foi direta. Antes de assumir o posto de ministro da Infraestrutura, Marcelo Sampaio foi secretário executivo da pasta de janeiro de 2019 a abril de 2022, considerado “braço direito” de Tarcísio Freitas, atual governador de São Paulo.
Sampaio foi presidente do Conselho Administrativo do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) e é analista de infraestrutura do Ministério do Planejamento desde 2008.
Vale possui vasta infraestrutura no Brasil que depende de interlocução e contratos com o governo federal A Vale é dona de ferrovias, portos, centrais hidrelétricas, siderúrgicas e também usa massivamente a malha rodoviária federal e depende do aval da União para conseguir as concessões de ferrovias, por exemplo.
O Observatório da Mineração revelou em julho de 2022 que a Vale é responsável, sozinha, por consumir 2% de toda a energia elétrica produzida no Brasil. A demanda de energia contratada pela Vale é equivalente à demanda de todo o estado do Espírito Santo.
Toda essa energia é gasta essencialmente para produzir e transportar minério de ferro, o principal produto da Vale, em Minas Gerais e no Pará.
A Vale é sócia da usina de Belo Monte em parceria com a Cemig, de Minas Gerais, e possui várias pequenas centrais hidrelétricas pelo Brasil. “A mineradora é dona, ainda, da Estrada de Ferro Carajás, fundamental para o vultuoso lucro da empresa, que arrasta por seu trajeto uma coleção de violações de direitos, como mostramos em matéria especial de maio de 2022”, revela o Observatório da Mineração. A ferrovia, inaugurada em 1985, tem hoje 892 quilômetros de extensão, ligando a maior mina de minério de ferro a céu aberto do mundo, em Carajás, no sudeste do Pará, ao Porto de Ponta da Madeira, em São Luís (MA).
Por seus trilhos, são transportados centenas de milhões de toneladas de carga, especialmente minério de ferro e 350 mil passageiros por ano. Circulam cerca de 35 composições simultaneamente, entre os quais um dos maiores trens de carga em operação regular do mundo, com 330 vagões e 3,3 quilômetros de extensão.
O veículo de mineração informou, ainda, que as principais reclamações das comunidades sobre os impactos da EFC incluem “a falta de acessos viáveis para atravessar a ferrovia de lado a lado como viadutos e passarelas, atropelamentos de pessoas e animais causados pelos trens, incluindo a morte e mutilação de moradores, o comprometimento da estrutura das casas, rachadas com o impacto constante da passagem dos trens, a poluição sonora, da água e do ar, além da perseguição a lideranças e a falta de diálogo da Vale com as comunidades.”
No fim de 2020, a Vale conseguiu prorrogar os contratos tanto da EFC quanto da ferrovia Vitória-Minas com o governo federal. A mineradora irá manter a concessão das ferrovias por mais 30 anos a contar de 2027, quando vencem os contratos atuais. O investimento previsto é de R$ 24,7 bilhões, a serem aplicados já partir do próximo ano.
Os investimentos englobam tanto o pagamento de outorgas pelas duas ferrovias (R$ 11,8 bilhões), como também contrapartidas acertadas com o governo federal, como R$ 8,7 bilhões para a construção da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (Fico), de interesse do agronegócio.
Quando era ministro, Marcelo Sampaio afirmou, em entrevista ao Valor Econômico, que uma das ideias encaminhadas era usar R$ 3 bilhões da indenização da Vale pelo desastre de Mariana nas obras da futura concessão da BR 381/262, de Minas ao Espírito Santo, diminuindo o investimento do setor privado para viabilizar o negócio. Um novo acordo por Mariana está em discussão com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de 2021 até hoje.
Camila Brunelli / Agência CMA
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