Entre seus efeitos mais imediatos, a reforma tributária desaguou numa corrida aos cartórios para “adiantar heranças”. A busca por acelerar o planejamento patrimonial e escapar de um aumento nos impostos tem chamado a atenção de advogados e especialistas em finanças.
A nova legislação prevê que o ITCMD — Imposto de transmissão causa mortis e doação, devido no caso de heranças — será progressivo, ou seja, quanto maior for o valor a ser herdado, maior será a tributação.
De acordo com o advogado Aílton Soares de Oliveira, a simples possibilidade de mudança já havia gerado o aumento da procura por seu escritório.
“Chamamos isso de planejamento sucessório. Não necessariamente uma antecipação de herança. Nosso Direito não prevê a herança de quem ainda vive, mas por liberalidade, o dono do patrimônio pode organizar de forma que seus herdeiros podem usufruir dos bens”, explicou, em entrevista ao Monitor do Mercado.
O especialista em Planejamento Sucessório e Contencioso de Família ainda comentou que desde o ano passado, com as incertezas sobre o resultado das eleições presidenciais, algumas famílias decidiram antecipar a transferência de parte de sua riqueza para a próxima geração.
Mauro Mori, sócio do Machado Associados na área societário, contratos e M&A, disse ter sentido um aumento significativo no número de consultas sobre o tema. Semanalmente, diz ele, pelo menos três famílias o procuram para discutir o assunto.
O especialista reforçou que o cliente deve repensar quando fazer a antecipação, uma vez que não é possível pedir o bem de volta. “Faz sentido, por exemplo, transferir um monte de bens para uma criança de 10 anos? Se eu já doei tudo para os meus filhos, nada mais é meu”, explica.
Mori afirma que a antecipação da herança é bem diferente de simplesmente ajustar um testamento, principalmente pelo timing. Enquanto os bens em testamento são repassados somente após a morte, a antecipação é feita enquanto a pessoa ainda está viva.
Planejamento sucessório para reduzir custos
Planejamento sucessório é parte essencial para a saúde financeira de famílias. De acordo com Jessica Fernandes, head da área de Vida da Wise Investimentos|BTG Pactual, isso pode garantir a perpetuação do patrimônio da família e minimizar os custos da transferência quando houver a necessidade, como na morte.
“O planejamento envolve o estudo e análise de todo patrimônio, suas divisões de acordo com o modelo de matrimônio, o cálculo previsto para a transferência, assim como a designação de beneficiários, por exemplo, em apólices de seguro de vida”, conta.
A especialista ainda orienta que os interessados façam identificação de todos os seus ativos, assim como das dívidas, e designem beneficiários (tanto primários, quanto secundários), considerem proteção de ambas as partes do conjunto matrimonial e revejam regularmente seu plano à medida que as circunstâncias mudam.
A advogada Juliana Maria Raffo diz, no entanto, que só adiantar a doação por conta da reforma não ajuda. O importante é estar atento às alterações legislativas. “Não vejo neste momento razão para antecipar as doações sem um planejamento mais apurado de outras questões que envolvem a sucessão, como possível conflito entre herdeiros que, nesses movimentos, acabam tornando-se coproprietários de um patrimônio sobre o qual, futuramente, terão que decidir de forma conjunta”, disse.
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