Com as recentes crises nas empresas de capital aberto, como o caso da Americanas, nos quais erros contábeis passaram despercebidos pelo mercado por anos, induzindo investidores ao erro, é de se esperar que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) crie novas regulamentações para empresas e profissionais do mercado de capitais.
A autarquia, vinculada ao Ministério da Fazenda e que age sob orientação do Conselho Monetário Nacional (CMN), desempenha um papel fundamental no mercado financeiro brasileiro, sendo responsável por regular e fiscalizar as atividades relacionadas ao mercado de capitais.
Embora monitore algo em torno de R$ 25 trilhões por ano, seu orçamento vem sendo reduzido ano a ano, hoje no seu menor patamar. Por outro lado, nos tempos atuais, a CVM é chamada a agir de forma dinâmica e a autarquia já demonstrou que está antenada com o mercado. Portanto, não será surpresa se novas regulamentações passarem a ser emitidas de forma mais constante.
Um exemplo disso foi a entrada em vigor das resoluções 178 e 179 no primeiro dia de junho de 2023, representando um novo marco regulatório para a atividade de assessor de investimentos, trazendo mais atribuições, transparência e flexibilidade nas relações societárias. Na prática, a CVM decidiu que os assessores podem fazer recomendações e se vincular a mais de uma corretora.
Agora, a recomendação de investimentos é oficialmente uma das atividades do assessor de investimento, mas é fundamental que elas estejam adequadas ao perfil do cliente e em conformidade com as regras do intermediário que oferece o produto.
Na opinião da presidente executiva da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil (APIMEC Brasil), Lucy Sousa, as novas normas da CVM são benéficas para o exercício do assessor de investimentos.
“É importante ressaltar que tal flexibilização da CVM decorre do seu novo entendimento de que os riscos que justificaram a vedação no passado, tais como preocupações acerca da ineficiência da fiscalização do órgão regulador, caso os assessores de investimentos estivessem vinculados a mais de um agente intermediário, podem ser mitigados a partir do reforço nas regras de transparência e de acesso à informação dos investidores sobre a atuação dos assessores de investimentos”, explica Lucy.
Dentre as inovações da Resolução 178, uma das mais esperadas e celebradas pelo mercado foi a previsão de assessor de investimento não exclusivo, ou seja, agora após a nova resolução é possível que o assessor de investimento esteja sob a responsabilidade de mais de um intermediário integrante do sistema de distribuição de valores mobiliários, algo que antes era vedado.
“Cabe salientar que o assessor de investimento que opte pela não exclusividade, será preposto de mais de um intermediário, o que pressupõe um investimento em transparência, melhores práticas e compliance maior, uma vez que deve se adequar a todos os intermediários as quais o assessor esteja vinculado. Quando da exclusividade a aderência recai ao compliance de apenas um intermediário, o que a princípio me parece uma tarefa mais fácil”, pontua a executiva da APIMEC Brasil.
Outro benefício das resoluções para os investidores é o aumento da segurança e transparência, porém, a executiva aponta desafios na implementação do Termo de Ciência, que deve descrever como são remunerados os assessores de investimento, direta e indiretamente, pelos produtos e serviços oferecidos, além de possíveis conflitos de interesse que possam existir.
“Este tema com certeza é o mais difícil de ser implementado, pois requer uma maturidade dos agentes de mercado, bem como a discricionariedade do que realmente é importante o investidor ter conhecimento. Por exemplo: os tipos de remuneração são diversos e bem diferentes entre si. Tal etapa será cumprida, principalmente diante da maturidade dos reguladores e dos autorreguladores. Porém, todos os agentes de mercado tem ciência que demandará um determinado tempo para conseguir um padrão de informação que seja objetivo e abrangente para o investidor”, aponta Lucy.
Com as resoluções que mudaram o arcabouço do assessor de investimentos, a CVM mostra que está atenta às transformações do mercado.
A CVM já divulgou uma pesquisa, que mostrou que 75% das pessoas que começaram a investir no Brasil buscam informações em canais de influenciadores. Futuramente a entidade, deve criar alguma resolução para essa atividade, que é confundida com a de analista. Nesse sentido, Lucy diz que não será surpresa se uma nova regulamentação da CVM for criada, para a função de Analista de Investimentos também.
“Porém, neste caso o tema está vivo, por exemplo nos EUA não existe uma regulação específica para os influenciadores, talvez a CVM também possa seguir neste caminho. Este tema está sendo debatido em todos os fóruns do mercado de capitais, pelas entidades autorreguladoras, pelos reguladores, inclusive no Primeiro Congresso realizado pela ANCORD e APIMEC Brasil que ocorrerá no final de setembro, haverá um painel específico deste tema, no qual a CVM terá oportunidade de atualizar os estudos estão sendo realizados, a respeito de uma eventual regulação ou não dos influenciadores.
O que fica claro para a APIMEC Brasil é que os influenciadores que pretendem influenciar o investidor na aquisição de valores mobiliários de forma direta devem realizar o exame CNPI e se credenciarem como analista de valores mobiliários. “Atualmente já existem casos de analistas que usam as plataformas digitais que credenciaram como analistas de investimento”, explicou a presidente executiva da APIMEC Brasil.
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