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Operação “Lava-Verde”

É preciso cautela para que ESG não seja mais um modismo corporativo e deve ser levada a sério

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icone de relogio 29/06/2023 11:00

Por Caio Campello de Menezes

ESG certamente está na agenda da maioria das empresas hoje em dia. As companhias devem zelar pela condução dos seus negócios alinhados com o meio-ambiente, a sociedade e a governança corporativa. Recursos significativos vem sendo aplicados em projetos ESG, com grande ênfase em projetos “verdes”. Inventar ou investir em produtos e práticas sustentáveis tem se tornado um grande negócio, suportado por uma forte propaganda. Tomar medidas corporativas para salvar o nosso planeta é louvável e merece aplausos. Afinal de contas, nada mais verdadeiro do que o título do livro de autoria de Mike Berners-Lee “There is no Planet B”. A Terra é o que temos, no momento.  

Entretanto, é preciso cautela para que ESG não seja mais um modismo corporativo. ESG deve ser levado a sério. Implementar projetos de sustentabilidade no mundo corporativo é um ato de responsabilidade e respeito não só com o planeta, mas com todos os cidadãos. Dizer que um projeto é “verde” precisa, realmente, significar que o projeto é destinado a esse propósito. ESG não pode, portanto, se tornar uma ferramenta de marketing, com o intuito de aumentar as vendas. É preciso haver verdade tanto na mensagem quanto na sua aplicação.  

Não monitorar a essência e a efetiva aplicação da iniciativa ESG pode impactar a reputação e imagem das companhias e, mais grave ainda, resultar em acusações, investigações e ações judiciais, o que vem sendo chamado de greenwashing.  

Empresas, dos mais diversos setores da economia, estão sendo acusadas por divulgarem elementos enganosos nas suas promoções de vendas de produtos e serviços “verdes”. Multinacionais como Mitsubishi, H&M, Walmart, Shell e Coca-Cola estão sendo investigadas e/ou processadas no exterior. O caso mais recente envolve a Nike, que é ré em uma ação coletiva ajuizada em maio de 2023, nos Estados Unidos (Ellis v. Nike USA, Inc et al). Alega-se que a Nike estaria enganando o mercado ao divulgar que determinados produtos seriam produzidos com material sustentável, utilizando fibras recicláveis, favoráveis à redução de carbono, quando na verdade, segundo alegado, a empresa estaria utilizando material sintético, inclusive plástico. 

Também recentemente, a FIFA foi alvo de acusação pelo órgão regulador suíço (Swiss Fairness Commission), que alega ter a FIFA feito declaração falsa a respeito da redução do impacto ambiental da última Copa do Mundo, no Catar, que alegadamente teria sido a primeira 100% livre de carbono. Segundo o SFC, a FIFA não conseguiu comprovar a veracidade e a certeza daquela declaração, considerada como “perigosa” e “tendenciosa”.  

A CVM lançou neste ano a “Política de Finanças Sustentáveis”, que define as diretrizes do plano de ação da CVM para o fortalecimento dos trabalhos de finanças sustentáveis no âmbito do mercado de capitais. A política objetiva aprimorar a divulgação dos resultados das atividades ESG adotadas pelas empresas com impactos no mercado de capitais. Com isso, espera-se que a CVM adote ações de supervisão e de monitoramento para coibir divulgações falsas por parte do participante do mercado sobre suas políticas socioambientais, que não se verificam na prática. 

Os consumidores, principalmente os mais jovens, estão ficando cada vez mais atentos e conscientes, sabendo diferenciar o que é uma mera propaganda do que um projeto verde na essência. Estão interessados em verificar se existe de fato uma causa ética e verdadeira por detrás de uma roupa vendida como sendo fabricada com plástico capturado nos oceanos.  

Descobertas vem sendo feitas por consumidores, ONGs e agências reguladoras, revelando que o que se diz nos rótulos não reflete a realidade. As empresas não podem se esconder por detrás de palavras difíceis ou de complexas combinações de elementos químicos da tabela periódica, sustentando, sem a devida precisão, que seu produto é ecologicamente sustentável.  

Para que um produto ou um serviço seja, genuinamente, ESG é preciso ter havido investimentos em pesquisas e desenvolvimento, com provas concretas, análises independentes, informações e dados sólidos, que possam sustentar aquela iniciativa. Não deve haver espaço para afirmações genéricas e vagas estampadas no rótulo de que o produto é “ecológico”, “sustentável”, “verde” ou “limpo”. Quanto mais específica e precisa a informação, menor o risco de alegações de fraude por parte do Governo, consumidores e dos próprios acionistas.  

Os departamentos Jurídicos, de Marketing, de ESG e de P&D deveriam se coordenar e se regular mutuamente, em um sistema de travas, determinando os limites até onde cada um pode ir. Alinhados, esses departamentos devem levar à discussão iniciativas corporativas verdes de forma coordenada e multidisciplinar, garantindo que todas as áreas deem suas contribuições sob a perspectiva de suas especialidades, conferindo maior segurança e previsibilidade à iniciativa verde. 

A certeza e a segurança de uma iniciativa ESG devem acompanhar não só o lançamento do produto ou serviço, mas também todo o seu processo de desenvolvimento. O constante monitoramento da execução deve ser considerado como um ato de governança corporativa. Afinal, investimentos pesados são feitos por acionistas e investidores e a companhia deve ter ferramentas institucionais capazes de assegurar a correta e específica destinação daqueles recursos para os projetos ESG. Vamos evitar a próxima Operação Lava Jato, na versão “verde”. 

Caio Campello de Menezes atua em arbitragens desde 1996, como advogado e árbitro, sendo reconhecido pelo diretório Chambers Partners como referência na área há mais de 10 anos consecutivos.

Imagem: Piqsels

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