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Precisamos de uma reforma tributária mais racional

Não existe solução simples para problemas complexos.

Dinheiro - Piqsels

icone de relogio 07/07/2023 13:04

*Por Fernanda Terra

Não existe solução simples para problemas complexos. Com isto em mente analisamos a atual expectativa em torno da Reforma Tributária, que segundo o ministro da Economia, Fernando Haddad, “é uma oportunidade que há muito tempo não se via no Brasil", se referindo à previsão de votação do substitutivo da PEC nº45 na primeira semana de julho na Câmara dos Deputados. 

O Sistema Tributário Nacional é complexo, temos tributos demais, carga tributária acima de 33% do PIB, com uma contrapartida governamental que não reflete o nível de tributação, obrigações acessórias que geram alto custo de compliance, litigiosidade de trilhões, guerra fiscal, tributação sobre o consumo regressiva, tributação sobre a renda que penaliza a classe média, tributação sobre o patrimônio defasada, e a lista segue.
Some-se a este cenário, que vem de longa data, uma economia pós-pandemia e juros altos, e temos a grande oportunidade, a Reforma Tributária tal qual disposta na PEC nº 45, chega como a resposta de todos os problemas, inclusive comparada ao Plano Real.

E, quando analisamos aquilo que é dito sobre o texto e não necessariamente o texto, há de fato uma unanimidade na necessidade de reforma, que poderia sim começar na tributação sobre o consumo.  Diminuir o número de tributos – neste momento sairíamos de 5 (PIS/Cofins/IPI/ICMS/ISS) para 3 (IBS/CBS/IS); o número de leis, quanto ao ICMS, reduziríamos de 27 para uma única; a problemática do aproveitamento de crédito, que em tese passaria a ser irrestrita; redução do número de alíquotas que deixaria de ser por produto, IVA moderno etc.

Há na ideia um apelo, que levou a classe política a abraçar o discurso de forma unânime, com exceção do governador de Goiás, Ronaldo Caiado, que vislumbra na modificação do principal imposto de competência estadual e com o fim da possibilidade de concessão de incentivos fiscais, a debelação do pacto federativo.

Nós estamos ao lado dele, tanto porque concordamos com sua análise política sobre os impactos desta reforma para os Estados (e municípios), quanto porque descemos ao texto legal, analisamos artigo por artigo e confrontamos com o que já foi feito no passado.

A título de exemplo, trazemos aquela que é anunciada como a maior inovação – o IVA moderno, não cumulativo, ou seja, o imposto pago na etapa anterior será compensado na posterior. Tal previsão está no Art. 156-A, §1º, VIII – será não cumulativo, compensando-se o imposto devido pelo contribuinte com todas as operações nas quais incida IBS.

A novidade, porém, já consta de outro texto constitucional, Art. 155, §2º, I - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa ao ICMS, incluído na Constituição pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993. 

Vemos, portanto, que o IVA moderno já foi previsto há 3 décadas com o ICMS, as limitações no aproveitamento dos créditos, que geram alta litigiosidade, vieram posteriormente na Lei Complementar e normas infralegais que surgem tanto pela dinâmica do Direito, quanto da voracidade fiscal. 

Este apontamento simples tem o intuito de chamar atenção para o texto da PEC, e o que ele propõe de fato, e não contrariar as ideias e premissas sustentadas de reforma do sistema. 

Que poderia ser iniciado com a fusão das contribuições ao PIS e Cofins: sem nenhuma mudança brusca, sairíamos de 5 para 4 tributos. Nesta mesma nova lei de fusão, revisão da forma de não cumulatividade destas contribuições, que poderia caminhar junto a reavaliação das normas infralegais que mitigam a não cumulatividade do ICMS, num esforço harmônico de que os dois tributos tivessem uma forma bastante semelhante de aproveitamento, o que reduziria as modificações em sistemas de departamentos fiscais. 

Quanto à demonizada Guerra Fiscal, uma discussão séria sobre formas de desenvolvimento do país, fora do Sudeste, com a implantação de políticas e até Fundos de desenvolvimento regionais, tão atrativos, faria a questão de desoneração tributária ficar em segundo plano.

Enfim, o sistema tributário precisa de mudança, há consenso neste ponto. Nosso questionamento repousa apenas, se a traremos de forma positiva, testando um novo modelo que em nossa análise já nasce cheio de problemas e gaps, ou se poderíamos fazê-la num caminho mais racional e com menos narrativas.


*Fernanda Terra, sócia do Terra e Vecci Advogados, é advogada tributarista, Mestra em Direito Tributário pela FGV-SP

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