Gabriel Galípolo é o mais novo nome do presidente eleito Lula, para a área da Economia. Ele foi anunciado nesta terça-feira (13) para ocupar o cargo de secretário-executivo no ministério da Fazenda, comandado pelo ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad.
Notícias apontam Galípolo como uma aposta do PT para uma convivência pacífica com o mercado financeiro, considerando que ele foi CEO do Banco Fator. No entanto, as opiniões dele sobre o mercado e a austeridade fiscal, que tem sido cobrada por players do mercado financeiro, não devem agradar grande parte da Faria Lima.
Galípolo é economista, foi CEO do Banco Fator de 2017 a 2021 e hoje é conselheiro da Fiesp, professor da UFRJ e pesquisador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri).
Na política, ele trabalhou na Secretaria Estadual de Economia e Planejamento de São Paulo, durante o governo de José Serra, e ajudou a construir o plano de governo de Aloizio Mercadante, ex-ministro de Dilma Rousseff, hoje cotado para assumir a chefia do BNDES ou da Petrobras.
Em seu livro “Manda quem pode, obedece quem tem prejuízo”, escrito em parceria com o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, publicado em 2017, Galípolo expõe posições bastante claras, dando dicas do que o mercado pode esperar de sua gestão como secretário da Fazenda. Veja trechos selecionados pelo Monitor do Mercado.
O economista é um crítico ferrenho das políticas de austeridade, que tanto têm sido cobradas por players do mercado. Para ele, o arrocho nas contas públicas, em vez de atrair dinheiro, acaba por apenas diminuir o emprego e a demanda. “A história recente da evolução da dívida pública no Brasil demonstra o avesso da sabedoria convencional”, alfineta.
“A noção de que a consolidação do orçamento pode ser expansionista (isso é, aumenta o crescimento e o emprego), por elevar a confiança do setor privado e o investimento, não se confirmou na prática” afirmou o economista
Seguindo seu raciocínio, políticas como o Teto de Gastos teriam pouca serventia ao país. “A poupança macroeconômica não pode jamais preceder o investimento”, afirmam Galípolo e Belluzzo.
No mesmo livro, os economistas fazem severas críticas ao mercado financeiro, afirmando que a política do “valor do acionista” acaba colocando o desempenho das empresas como refém das políticas de curto prazo e da redução de custos, impedindo o verdadeiro crescimento.
“O império do ‘valor do acionista’ desatou surtos intensos de reengenharia administrativa, estimulando a flexibilização das relações de trabalho. O desempenho empresarial tornou-se refém do ‘curto-prazismo’ dos mercados financeiros e da redução de custos.”
Veja trechos relevantes da obra de Galípolo e Belluzzo:
“A ocorrência, desde 1980, de aproximadamente 150 convulsões com influxos de capitais, em mais de 50 mercados emergentes, credencia a reivindicação do economista de Harvard, Dani Rodrik, de que esses “dificilmente são efeitos ou defeitos secundários nos fluxos de capital internacional; eles são a história principal”. Segundo o estudo, as políticas de austeridade não só geram substanciais custos ao bem-estar pelos canais da oferta, como deprimem a demanda e o emprego. A noção de que a consolidação do orçamento pode ser expansionista (isso é, aumenta o crescimento e o emprego), por elevar a confiança do setor privado e o investimento, não se confirmou na prática.”
“A macroeconomia ensinada nas últimas décadas nas academias do mundo anglo-saxão não contempla a existência de dinheiro, bancos ou mercados financeiros. Os mercados de crédito, de avaliação da riqueza e suas poderosas instituições – o sistema nervoso que comanda o capitalismo – são impedidos pela racionalidade dos “mercados eficientes” de desatar corridas para a liquidez e crises financeiras. Se não há dinheiro verdadeiro, não há demanda de liquidez.”
“Os grandes bancos internacionalizados, sobretudo os bancos americanos, cuidaram de administrar em escala global a rede de relações débito-crédito. Ao comandar a circulação de capitais entre as praças financeiras, tornaram-se senhores dos “fundamentos econômicos” com poder de afetar a formação das taxas de juro e de câmbio. Esta submissão dos Estados aos ditames da finança globalizada foi acompanhada de mudanças na estrutura da propriedade e da concorrência, ou seja, os grandes bancos financiaram e organizaram o jogo da concentração patrimonial e produtiva.”
“Após a crise financeira de 2007/2008 a política de socorro às instituições financeiras grandes demais distribuiu prêmios aos seus arquitetos, flagrantes na autorização do “independente” Federal Reserve para utilizar US$ 700 bilhões dos contribuintes na compra de títulos podres e nos casos conhecidos como golden parachutes (paraquedas de ouro). O quantitative easing descarregado nos bancos não recuperou as economias, socializou prejuízos e privatizou riqueza pública por meio do endividamento dos Estados, acentuando a concentração de renda.”
“A história dos últimos 40 anos desvela as raízes do déficit democrático. Aos neoliberais não interessa reduzir o tamanho do Estado, senão capturar suas forças para apoiar a difusão da concorrência em todas as esferas da vida.”
“Ao longo das últimas décadas, o acirramento da concorrência – esta é a alma da globalização – impôs às empresas de diversas origens a formação de joint-ventures e a busca de cooperação e de alianças estratégicas. Este movimento foi determinado fundamentalmente pelos custos de inovação e por exigências de escala relacionadas com a nova onda de progresso técnico – telecomunicações, informática, microeletrônica eautomação industrial, química fina – de rápida difusão desde os anos 80.”
“Na mídia impressa e na eletrônica, as matérias de negócios e economia disseminam os fetiches dos mercados financeiros embuçados na linguagem do saber técnico e esotérico. Qual bonecos de ventríloquo, os comunicadores “falam” a língua articulada conforme as regras gramaticais dos mercados. Assim, o capitalismo investido em sua roupagem financeira cumpre a missão de “administrar” a constelação de significantes à procura de significados, submetendo os cidadãos-espectadores aos infortúnios da domesticação e da homogeneização, decretados pelo “coletivismo de mercado”.”
“Em uma sociedade que celebra o ideal de ganhar dinheiro, é fácil inferir que os interesses do sistema financeiro são os mesmos que os do país, e os “vencedores” do setor sabem melhor do que os funcionários públicos de carreira. As falácias desta nova crença são por demais conhecidas e não paga a pena rebobinar os argumentos para passar filme velho. Mas é sem dúvida impressionante o número de convertidos que se tornaram fanáticos do laissez-faire.”
“No âmbito da economia doméstica, o ato individual de poupar a partir de uma renda já criada é pré-condição para a acumulação de riqueza. Na esfera macroeconômica, para o conjunto da economia, a formação da renda (e a posterior decisão de poupar) depende do ânimo de gastar dos empresários, sancionado pela disposição do sistema de crédito em abrir mão da liquidez.”
“Foi descoberto (com oito décadas de atraso) e reconhecido pelo Fórum Econômico Mundial que a propensão a consumir nas rendas mais altas é significativamente inferior do que nas rendas mais baixas, que tendem a gastar tudo que recebem. Quando uma parcela crescente da renda nacional se dirige aos ganhos de capital, a demanda pode enfraquecer e, com ela, o investimento.”