A segunda safra de milho no Brasil deve atingir 123,3 milhões de toneladas (mmt), segundo estimativa da Agroconsult, organizadora do Rally da Safra.
Com a safra verão somando mais 27 mmt, a produção total de milho deve chegar a 150,3 mmt, apontando um crescimento de 21,3 mmt em relação à temporada anterior.
O resultado histórico representa um aumento de 20,2 mmt em comparação com a safra 2023/24 e foi impulsionado por produtividade média recorde de 113,8 sacas por hectare, a maior já registrada no país. A estimativa inicial era de 105 sacas.
Segundo André Debastiani, coordenador do Rally da Safra, o volume é fruto de boas condições climáticas, principalmente pela regularidade das chuvas entre abril e junho. “As lavouras tardias vão entregar uma produtividade nunca vista”, afirma.
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Pressão geopolítica sobre os preços do milho
A combinação de produção elevada, estoques altos e incertezas no comércio exterior já impacta os preços no Brasil, especialmente no Cerrado.
“A queda nas cotações no Mato Grosso ao longo dos últimos 30 dias reflete essa expectativa de excesso de milho”, avalia André Pessoa, especialista em análise de mercados agrícolas e de política agrícola da Agroconsult.
Segundo ele, ainda não houve uma pressão generalizada nos preços porque a colheita está lenta. “O milho ainda apresenta umidade de 35% a 37%, o que impede a colheita em ritmo acelerado. Mas assim que o tempo secar e a colheita avançar, a pressão será sentida com mais intensidade em todas as regiões.”
Pessoa alertou para a possibilidade de o país virar o ano com estoques extraordinariamente elevados, o que tende a pressionar os preços para baixo no último trimestre.
Logística também segue sob pressão
A colheita, embora promissora, enfrenta atrasos devido à umidade, o que, segundo Debastiani, torna o escoamento um desafio logístico.
“Parte significativa do milho poderá ficar armazenada a céu aberto, como já ocorreu em anos anteriores, pressionando infraestrutura de transporte e exportação”, alerta.
Além disso, a comercialização segue lenta: apenas um terço da safra foi vendida até o momento. Há sinalizações de preços abaixo de R$ 40 por saca, especialmente no Mato Grosso.
Produção de milho por região
A área plantada da segunda safra de milho cresceu 5,7%, totalizando 18,1 milhões de hectares, um aumento de 982 mil hectares.
A nova medição da Agroconsult, realizada com a ferramenta Cropdata, que permite avaliação via satélite, estima 1,2 milhão de hectares acima do número oficial da Conab.
Os principais estados produtores registraram recordes de produtividade:
- Mato Grosso: 131,9 sacas por hectare (+11,6% sobre a safra anterior), com destaque para regiões com médias próximas de 140 sacas. A produção no estado deve superar 98 milhões de toneladas, em 7,4 milhões de hectares plantados.
- Goiás: 126,1 sacas por hectare (+5,6%). Segundo Debastiani, “Goiás só não bateu os 130 por conta de perdas nas regiões noroeste e leste devido ao calor entre fevereiro e março. Mas no sudoeste do estado, os resultados foram excelentes”.
- Mato Grosso do Sul: 98,1 sacas por hectare (+35% sobre a média de 72,6 da safra anterior). A safra é considerada de recuperação.
- Paraná: 106,5 sacas por hectare (+16,5%). A média supera a da temporada anterior (91 sacas), com destaque para a recuperação da região norte.
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Consumo doméstico em alta
Os estudos do Rally da Safra revelam que a demanda interna está aquecida. O mercado de rações avança com a reabertura dos mercados internacionais após a superação da gripe aviária, e o setor de etanol de milho opera próximo do limite de capacidade. A estimativa da Agroconsult é de consumo interno de 97 milhões de toneladas.
“Fechamos a última semana com mais de 28 dias de desinfecção em Montenegro. Com isso, declaramos o país livre de gripe aviária, o que favorece a retomada de exportações de carne e impulsiona o mercado de rações e milho”, afirma Debastiani.
Exportações e cenário global
A previsão da Agroconsult é de exportar 44,5 milhões de toneladas no segundo semestre. No entanto, o volume depende da conjuntura internacional.
André Pessoa, aponta preocupações: “A China está ausente do mercado. O Irã, importante comprador, está envolvido em tensões com Israel. Há ainda uma forte concorrência da Argentina, Ucrânia e EUA, que deve colher cerca de 400 milhões de toneladas.”
“O Irã representa cerca de 12% das nossas exportações nos últimos anos. Em 2023 foram 4,3 milhões de toneladas. Com o conflito no Oriente Médio, será difícil manter esse ritmo de embarques no segundo semestre”, explicou Pessoa.
Segundo ele, o Brasil terá de buscar novos compradores, o que pode afetar o volume total exportado.
Além disso, o câmbio atual não favorece as exportações e o Brasil tem prazo limitado para escoar o milho antes da entrada da próxima safra de soja. “Não temos 12 meses para exportar. É um desafio logístico significativo”, destacou.
Rentabilidade e expectativa frustrada
Quando a safrinha atual foi plantada, os sinais de mercado para 2025 eram positivos. Além disso, houve queda no custo de insumos, como sementes, o que projetava boa rentabilidade.
Segundo Pessoa, “Quem não vendeu antecipadamente vai enfrentar preços piores do que o esperado. A produtividade veio muito acima do previsto, o que mudou completamente o cenário de comercialização”.
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Riscos financeiros e crédito rural
A alta produção também coloca pressão sobre o crédito rural. Segundo Carlos Aguiar, diretor de negócios do Santander, a Selic elevada (atualmente em 15%) e o endividamento acumulado do setor agrícola desde a pandemia dificultam o pagamento de financiamentos.
“Muitos produtores se endividaram quando os juros estavam em 2%. Hoje estão em 15%. Mesmo com facilitação de prazos, não significa que será possível pagar. A renegociação é para dar fôlego e permitir desalavancagem”, explica.
Além disso, Aguiar destacou que a palavra-chave no crédito atualmente é “seletividade”. “Tem aumentado muito a seletividade dos bancos. Os produtores estruturados, com gestão profissionalizada e adequada gestão de risco, acabam tendo uma oferta de crédito ampliada.
O dinheiro está mais caro, mas não há restrição de acesso para quem apresenta baixo risco, especialmente nos bancos privados.”
Por outro lado, há uma parte do mercado com acesso mais limitado ao crédito. “Alguns têm seus limites revisados para baixo, ou não conseguem acompanhar o aumento do custo de produção. Outros não acessam mais o mesmo número de linhas ou financiadores. Até no barter, há restrição para muitos”, completa.
O Santander projeta que a Selic deve permanecer elevada até pelo menos o primeiro trimestre de 2026. “O cenário é cauteloso. A margem tende a retornar ao histórico, mas não será extraordinária. Quem conseguir pagar parte da dívida e os juros deve buscar alongar prazos com os bancos”, recomendou.
Aguiar conclui que, para aumentar a capacidade de financiamento futuro, os produtores precisam rever seu grau de alavancagem e risco. “Esse é o jogo: quem estiver mais organizado financeiramente terá mais acesso ao crédito.”
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Projeções para os estoques finais da safra de milho
De acordo com André Pessoa, os estoques finais de milho no Brasil devem superar os 20 milhões de toneladas, número acima da estimativa da Conab.
A previsão de consumo doméstico é de 97 milhões de toneladas, mas o número está sob revisão. “O uso industrial do milho, além do etanol, deve crescer. A estimativa pode subir”, afirma.
Caso o Brasil não consiga escoar mais de 40 milhões de toneladas em exportações, o volume excedente reforçará os estoques internos, aumentando a pressão sobre os preços.
