Nos Estados Unidos, ações negociadas abaixo de US$ 5 recebem o apelido pouco elogioso de penny stocks, ou ações de centavos, em tradução livre. Quando uma empresa entra nesse patamar, investir nela é considerado mais arriscado do que o normal, pois sua volatilidade tende a aumentar e sua liquidez, a diminuir, segundo a própria SEC, a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA.
Quando usamos a mesma régua para medir o mercado de ações brasileiro, temos um grande problema em mãos: com a recente desvalorização do real, mais de 80% das ações negociadas na nossa Bolsa seriam consideradas penny stocks por investidores americanos.
E se engana quem acha que isso é algo corriqueiro para o nosso mercado, por conta da questão cambial. Em 2019, pouco mais de metade das ações estavam nesse patamar (218, exatamente). Agora, temos 349 penny stocks em um universo de 425 papéis negociados na B3, segundo levantamento da consultoria Elos Ayta, especializada no levantamento de dados para o mercado financeiro.
- 📈 Quer investir na Bolsa de Valores como os grandes? Veja os ativos selecionados pelos especialistas do BTG – 100% grátis!
No Brasil, o conceito foi adaptado, sendo aplicado apenas às ações negociadas por menos de R$ 1. Neste ano, aliás, 13 ações chegaram a ser cotadas abaixo de R$ 1 e, por regra da B3, suas empresas fizeram um grupamento (reajuste do número de ações para aumentar o preço unitário), o mascarando a real dimensão do problema.
Usar o conceito norte-americano e colocar a etiqueta de “penny stock” em ações cotadas abaixo de US$ 5 ajuda a entender o olhar estrangeiro para o mercado brasileiro. Isso é essencial, afinal, é o dinheiro internacional que efetivamente tem o poder de mudar a direção da nossa Bolsa.
Em entrevista ao Monitor do Mercado, o CEO da Elos Ayta, Einar Rivero, deixa o alerta: “Sob a ótica do investidor estrangeiro, a B3 caminha para se tornar um mercado de penny stocks”.
Para Rivero, isso pode trazer consequências para além do aumento da volatilidade, como dificuldade de financiamento de empresas e aumento do risco de manipulação de mercado.
Leia a entrevista na íntegra:
Monitor do Mercado: Qual o impacto dessas ações para o mercado brasileiro?
Einar Rivero: A multiplicação das penny stocks pode trazer consequências negativas para o mercado: as empresas de menor porte podem enfrentar dificuldade de financiamento, a redução da base acionária, aumento do risco de manipulação e especulação, além da queda da liquidez, ao mesmo tempo que se aumenta a volatilidade.
MM: Quanto as penny stocks são atrativas para o mercado estrangeiro?
ER: Se esse cenário persistir, investidores institucionais devem se afastar, o que prejudica ainda mais a imagem da Bolsa brasileira no exterior. Então, se nós não temos investidor estrangeiro, a gente está, basicamente, perdendo fôlego e perdendo chance de crescimento. Sob a ótica do investidor estrangeiro, a B3 caminha para se tornar um mercado de penny stocks.
- ⚡ Investir sem estratégia custa caro! Garanta aqui seu plano personalizado grátis e leve seus investimentos ao próximo nível.
MM: Diversas empresas tiveram seus resultados do último trimestre impactados pela desvalorização do real perante o dólar. Esse impacto também reflete na perda de valor de negociação das ações na B3?
ER: É verdade que o mercado brasileiro está barato e que a alta do dólar prejudicou as empresas brasileiras, principalmente as com dividendos em dólares. No final ele acaba influenciando no lucro. E os resultados do ano passado estão vindo também impactados por essa valorização forte do dólar em 2024.
A volatilidade do dólar faz com que o investidor estrangeiro, quando vem para cá, não tenha somente o risco da volatilidade do papel. Ele acaba embutindo também a volatilidade do dólar, muitas vezes influenciada pelo mercado internacional, pelo mercado nacional e pela política monetária brasileira.
As exportadoras, por exemplo, ganham muito dinheiro a mais porque estão exportando em dólares e recebendo em reais. Por outro lado, as empresas que têm dívidas em dólares são penalizadas, vendo suas dívidas crescerem muito fortemente. Então, os departamentos financeiros dessas empresas se organizam com hedges de dívida para cobrir eventuais altas ou quedas do dólar.
MM: Essa característica atípica do mercado de ações explica uma possível mudança do perfil da B3 nos últimos anos?
ER: A bolsa tem perdido o perfil de 10 anos atrás. Está há 3 anos sem IPOs e a empresas têm feito cada vez mais venda de ações. A mudança do perfil não depende só da B3, depende também da política financeira no mercado brasileiro, uma taxa seletiva tão elevada, inviabiliza isso.
MM: Quais seriam as alternativas para essa mudança do mercado de ações?
ER: Há oportunidades em empresas que não estão em negociação, as que chamo de “barriga de aluguel”, que forçam uma adaptação do mercado às empresas que querem entrar na bolsa, mas por toda a burocracia e custos, encontram essa alternativa nos IPOs reversos.
Em algum momento o mercado vai ter que mudar as regras para que a gente não fique sem ações por aqui. Está surgindo a bolsa no Rio de Janeiro e tem a BEE4, que faz listagem de empresas pequenas, trazendo-as de uma forma diferente para o mercado financeiro, por meio de tokens. Começamos a enxergar algumas opções que podem acabar sendo interessantes, porque o mercado internacional olha para o Brasil com bons olhos.
- ⚡ A informação que os grandes investidores usam – no seu WhatsApp! Entre agora e receba análises, notícias e recomendações.
MM: Esse pode ser também um cenário de oportunidades?
ER: Temos opções de investimentos, mas as ações não vão dar um retorno no curto prazo, mas a médio longo prazo e para isto, o investidor tem que estar muito atento. A dica é procurar uma boa empresa de assessoria de investimentos que tenha condições de dar um respaldo. Não é simplesmente ouvir alguém dizer que uma ação compensa; precisamos entender o fundamento.
Às vezes você pode entrar num flipper e se você está pensando em longo prazo, não ser uma boa opção, mas se você está fazendo trader, já muda; depende de como você vai trabalhar o mercado.