O Senado aprovou nesta terça-feira (30) o Projeto de Lei Complementar (PLP) 108/2024, que trata da segunda fase da regulamentação da reforma tributária.
A proposta detalha regras para o funcionamento do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), tributos que substituirão as formas atuais de tributação, ICMS (estadual) e ISS (municipal).
Contudo, o IBS só começa a valer de forma plena a partir de 2033. Até lá, os impostos atuais continuam sendo cobrados normalmente.
O texto, relatado pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM), sofreu alterações e por isso retorna para análise da Câmara dos Deputados.
Segundo José Rubens Constant, especialista em Direito Tributário do escritório JLegal Team, a proposta recém-aprovada pelo Senado é um avanço importante, julgando pelo caráter de simplificação do sistema tributário brasileiro, redução de litígios e adoção do princípio da não-cumulatividade plena.
No entanto, “regimes especiais devem pressionar a alíquota de referência, que pode ficar entre 26,5% e 28%”, afirma Constant.
Para o especialista, as novas medidas tributárias devem beneficiar especialmente a Indústria e exportadores, com a desoneração das cadeias longas e eliminação da guerra fiscal.
Por outro lado, setores de serviços, consultorias, tecnologia, saúde, educação privada e construção civil, devem ter de lidar com um aumento de carga de impostos e repasse dos preços.
Senado aprova criação do Comitê Gestor do IBS
O projeto aprovado pelo Senado cria o Comitê Gestor do IBS, entidade pública com autonomia técnica, orçamentária e financeira.
A diretoria do comitê terá caráter técnico e cuidará da operação do imposto, mas a instância máxima será o Conselho Superior, formado por 27 representantes dos estados e Distrito Federal e 27 representantes dos municípios.
O comitê terá como funções calcular quanto cada estado e município receberá, distribuir a arrecadação, fiscalizar empresas e cobrar impostos atrasados, além da aplicação de multas.
Apesar do movimento positivo ao criar o comitê, Constant ressalta dois pontos de atenção: a governança do Comitê Gestor, para equilibrar Estados e Municípios, e o limite das exceções, que hoje é muito amplo.
Outra preocupação é o tratamento da folha de salários em serviços intensivos em mão de obra, como saúde, educação e tecnologia.
Período de transição da reforma tributária
O IBS (tributo criado na primeira parte da reforma) entrará em fase de teste já em 2026, mas a substituição plena de ICMS e ISS ocorrerá apenas em 2033.
Para evitar choques nas contas públicas, a calibragem da alíquota será feita gradualmente entre 2029 e 2032.
Em 2032, o valor arrecadado de ICMS por cada estado será a referência para definir a parcela de IBS a ser recebida a partir de 2033.
Para o cálculo da alíquota, o projeto aprovado prevê que a alíquota de referência do IBS será calculada com base na arrecadação de ICMS e ISS dos anos de 2024 a 2026.
A versão anterior, votada na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado, previa usar dados de 2012 a 2021 para o cálculo da alíquota de referência do IBS.
O novo texto também prevê a criação da Câmara Nacional de Integração do Contencioso Administrativo, destinada à harmonização da jurisprudência fiscal envolvendo o IBS e o CBS. Na composição da Câmara, o presidente só votará em caso de empate, extinguindo o “voto de qualidade” que favorecia o fisco.
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Quando os impactos começam a ser sentidos
Para José Rubens Constant, os efeitos iniciais da reforma devem decorrer da adaptação operacional — em 2026, começa a cobrança dos novos tributos sobre o consumo: “0,9% de CBS e 0,1% de IBS, que funcionarão como alíquota-teste e serão compensados com PIS e Cofins devidos no mesmo período. Nesse mesmo ano, o Senado fixará a alíquota de referência da CBS, que passará a valer em 2027 caso não haja outra definida por lei.”
Ele enfatiza ainda que “a partir de 2027, a CBS será efetivamente cobrada pela alíquota de referência, enquanto o IBS terá início com uma alíquota reduzida: 0,05% estadual e 0,05% municipal. Nesse ano, PIS e Cofins serão extintos, assim como o IPI (exceto para produtos vinculados à Zona Franca de Manaus). Ou seja, será a primeira virada concreta para as empresas, que terão de refazer seus sistemas de apuração e escrituração.”
De acordo com o especialista, em 2029 inicia a transição mais pesada da reforma tributária, uma vez que tanto o ICMS quanto o ISS começam a ser reduzidos gradualmente, enquanto o IBS passará a ser cobrado com base nas alíquotas de referência fixadas pelo Senado ou pelas legislações estaduais e municipais.
Esse processo seguirá até 2033, quando ICMS e ISS serão extintos, e o IBS assumirá plenamente a tributação no consumo.
Créditos de ICMS após a reforma tributária
O texto regulamenta também os créditos acumulados de ICMS, que deixarão de existir em 2033. Até lá, as empresas poderão usar os créditos para compensar débitos de ICMS, se autorizado pelo estado; outras alternativas disponíveis são a compensação com o IBS, a transferência para terceiros e a solicitação de ressarcimento em até 240 parcelas mensais.
Se houver crescimento real da arrecadação do IBS, os estados poderão ainda antecipar o pagamento das parcelas a partir de 2034.
O split payment contra a sonegação de impostos
Para promover maior segurança e conter o índice de sonegação de impostos após a implementação do novo sistema tributário, o texto também aprovou o split payment, mecanismo de recolhimento automático de impostos que deve assegurar que a arrecadação ocorra no ato da operação.
Nesse modelo, no momento da transação, o valor do imposto devido é separado: uma parte segue diretamente ao vendedor e outra parte ao governo.
Consant ressalta como pontos primordiais para as empresas neste primeiro ano a fim de evitar erros, ou acabar incorrendo em sonegação de impostos: a adaptação de sistemas de ERP e notas fiscais, mapeamento de créditos e débitos na cadeia, revisão de contratos de longo prazo, simulação dos impactos de alíquota e capacitação profissional.
O especialista conclui ainda que o acompanhamento próximo da atuação do Comitê Gestor será essencial para evitar surpresas.
Alterações no regulamento da reforma tributária
- ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação): o tributo não incidirá sobre benefícios de previdência privada complementar herdados, alinhando-se a decisão do STF.
- Base de cálculo para quotas e ações: em transmissões de participações não listadas em bolsa, a base de cálculo será o valor patrimonial.
- ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis): municípios poderão exigir a antecipação opcional do pagamento no momento da formalização da transferência.
- Nanoempreendedor: regime especial com isenção de IBS e CBS para faturamento anual até R$ 162 mil foi estendido a taxistas, mototaxistas e caminhoneiros autônomos.
- Imposto seletivo: bebidas açucaradas entram na lista de cobrança gradual entre 2029 e 2033, com teto de 2%, em linha com bebidas alcoólicas e cigarros.
- Veículos para PCD: o limite para isenção na compra de veículos por pessoas com deficiência sobe de R$ 70 mil para R$ 100 mil.
- Nafta: a tributação na importação de nafta destinada à gasolina foi antecipada para antes de 2033, fechando brechas para fraudes e reforçando a arrecadação dos estados.
- Iluminação pública: a Contribuição para Iluminação Pública poderá financiar monitoramento e segurança urbana, como câmeras e centros de controle, o que pode elevar o valor da contribuição.
- SAFs (Sociedades Anônimas do Futebol): redução de alíquotas federais. A CBS cai de 1,5% para 1% e o IBS de 3% para 1%, levando a carga total de 4% para 3%.
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Financiamento do Comitê Gestor
A União financiará o Comitê Gestor entre 2025 e 2028, com até R$ 3,8 bilhões. Depois disso, o órgão será custeado com percentuais decrescentes da arrecadação do IBS.
Será custeado 100% em 2026, caindo gradualmente até 0,2% em 2032, com o orçamento disponível fiscalizado pelos tribunais de contas.