A disputa presidencial está mais favorável para o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, mas deve caminhar para o segundo turno, a depender do comportamento do atual presidente Jair Bolsonaro, que tem a economia a seu favor. Mas, independente do vencedor, o eleito governará com bastante dificuldade para construir uma base governista e conquistar um eleitorado bastante volátil.
Essa é a avaliação dos cientistas políticos Lucas Aragão, CEO da consultoria política Arko Digital, e Silvio Cascione, diretor da Eurasia Group, que participaram do MKBR22, evento realizado pela B3 e Anbima.
“A eleição atual é o paredão do ódio. É muito comum ver presidentes que têm baixa popularidade porque os votos estão sendo para evitar algo do que para concordar”, disse Lucas Aragão, CEO da consultoria política Arko Digital, que cita a variedade de perfis dos últimos presidentes eleitos para explicar como o eleitor é aberto a diferentes propostas.”Os EUA nunca elegeram uma mulher presidente, como o Brasil.”
A eleição será definida no primeiro turno ou haverá quase um empate.
Para Silvio Cascione, da Eurásia, o cenário atual está melhor para o Lula, mas alguns fatores podem beneficiar Bolsonaro. “Primeiro, ele tem uma base forte. Segundo, os candidatos são muito conhecidos e o tema que mais desperta interesse é a economia, que está se recuperando mais rápido que o esperado. Ainda há cinco semanas, com um nível alto de estímulo, então, isso pode favorecer Bolsonaro. Se ele demonstrar mais empatia, pode reverter o cenário para o lado dele. Um discurso mais empático às mulheres e à economia, pode favorecer o Bolsonaro”, avalia.
Silvio acha difícil antecipar o voto útil e pondera se ele já não está nas intenções de
voto para Lula. Isso dificulta uma vitória no primeiro turno. Ele também acha difícil prever o impacto das abstenções.
Lucas Aragão cita pesquisa da Atlas/Intel para Arko que já mostrou que o voto útil está com Lula e que a eleição deve ir para o segundo turno.
Em relação às abstenções, o analista afirma que não dá para ver a relação com a renda nas pesquisas. “As mais qualificadas, como Datafolha, indicam que abstenção preocupa. O Poder Data indica que o eleitor do Lula é menos engajado que o do Bolsonaro. Mas isso pode se reverter de um turno para o outro.”
Em relação a um eventual questionamento do resultado, os analistas avaliam que isso não vai impedir que o próximo governo ocorra.
“Pode haver turbulência, mas o avião vai pousar, o candidato assumirá e o país será
governado”, opina Aragão. “Bolsonaro pode questionar mas não há fôlego para que isso se torne algo maior. Vira manchete, faz os investidores estrangeiros questionarem, mas não vai ter novo governo”, opina Aragão.
Para Silvio Cascione, esse clima turbulento favorece a radicalização e a ocorrência de
eventos mais extremos, como bloqueios de rodovias. “Pode ter efeitos secundários, mas, como houve nos EUA, ter consequências mais graves, como pessoas morrendo no parlamento. Mas em seguida, isso gerou mais apoio ao novo governo. No Brasil, hoje pode estar tranquilo, mas a longo prazo, a falta de representatividade democrática pode gerar eventos mais sérios.”
Engajamento
Aragão avalia o Brasil como um eleitorado volátil, que dá chances para novas propostas, mas que há um amadurecimento, principalmente do bolsonarismo, que ele prevê que seja duradouro. “Por outro lado, ele não tem um partido forte, mas tem um público fiel, que deve continuar apoiando.”
Para Cascione, apesar do Bolsonaro estar levando muita gente para rua, o PT também tem feito o mesmo. “O que explica a diferença é que, além do fato das imagens serem tiradas pelas campanhas para convencer o eleitor, o bolsonarismo é muito engajado e leva um público de classe média, que é mais propenso a ir para esses eventos de rua”.
Para Aragão, o engajamento do eleitor do Bolsonaro é muito forte, mas a urna não percebe sentimento e o vencedor da eleição pode ser alguém que não engaje tanto, mas tenha mais votos.
Por outro lado, a esquerda está em desvantagem pois não renovou seus quadros, confia no mesmo candidato há muitos anos, o que pode prejudicá-la a longo prazo. Mas isso também dependerá do sucesso de um possível novo governo.
Além disso, a governabilidade dependerá de muito consenso, haverá muito embate com o legislativo, na sua visão.
Cynara Escobar / Agência CMA
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