A bioenergia desenvolvida em países tropicais, como o Brasil, é uma solução de baixo carbono comprovada que enfrenta ceticismo e barreiras regulatórias no cenário internacional, diz estudo publicado pela Fundação Getulio Vargas (FGV).
Um estudo desenvolvido pelos especialistas do Observatório de Bioeconomia da FGV Luciano Rodrigues, Angelo Costa Gurgel, José Guilherme de Oliveira Belon e Lucas Rodrigues, indica que a bioenergia tropical é um componente estratégico na transição energética, mas seu reconhecimento pleno é limitado por disputas políticas e econômicas globais.
A bioenergia já responde por cerca de 60% de toda a energia renovável consumida no Brasil, uma participação sem paralelo em economias de perfil agroindustrial similar.
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O desempenho climático da biomobilidade brasileira
A análise comparativa da mobilidade leve (veículos de passeio) entre Brasil, EUA, China e União Europeia (UE) utilizou a metodologia de Análise do Ciclo de Vida (ACV), que mede as emissões de gases do efeito estufa (GEE) do processo completo, conhecido como “berço ao túmulo” (cradle-to-grave).
Os resultados demonstram que o desempenho climático dos veículos flex-fuel brasileiros movidos a etanol supera o de carros elétricos a bateria (Battery Electric Vehicles – BEVs) em mercados onde a matriz elétrica ainda depende de carvão ou gás natural.
Especificamente, os veículos a combustão interna (Internal Combustion Engines – ICEs) e os híbridos convencionais (Hybrid Electric Vehicles – HEVs) abastecidos com etanol no Brasil, assim como os BEVs recarregados com a matriz elétrica nacional, estão entre os de menor emissão no ciclo de vida completo.
Apesar da frota nova brasileira ser predominantemente composta por veículos a combustão (cerca de 94% das vendas em 2024), ela apresentou uma média de emissões de GEE de 151 g CO₂ eq./km.
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Esse valor é 31% inferior ao registrado na UE, 34% menor do que nos EUA e 42% abaixo do verificado na China, onde BEVs e híbridos plug-in (PHEVs) representam quase metade das vendas.

Barreiras regulatórias enfrentadas pela bioenergia tropical
O estudo aponta que leis na UE, nos EUA e em organismos internacionais impõem regras que atuam como barreiras climáticas, penalizando a bioenergia tropical mesmo diante de sua eficácia em mitigação.
Um critério controverso é a restrição associada às mudanças indiretas no uso da terra (iLUC). O iLUC é um fenômeno de difícil mensuração e sem consenso científico, que penaliza o balanço de carbono do biocombustível.
Segundo o estudo, a penalização é considerada assimétrica porque critérios de iLUC raramente são aplicados a outras tecnologias que também exigem uso da terra, como fazendas solares ou hidrelétricas.
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A regulamentação da UE, por exemplo, utiliza multiplicadores que aumentam artificialmente a contribuição da eletricidade e de combustíveis sintéticos para o cumprimento de metas, criando vantagens assimétricas e distorções competitivas no mercado.
Adicionalmente, mecanismos regulatórios, como a proposta da Agência de Proteção Ambiental (EPA) dos EUA para 2026-2027, reduzem o valor dos créditos de biocombustíveis importados pela metade em comparação aos nacionais. Essa medida é classificada como uma barreira comercial clássica, abandonando a retórica climática em favor do apoio à indústria doméstica.
Dilema “comida x combustível”
A pesquisa também critica o impasse “food vs. fuel” (comida versus combustível), a ideia de que a produção de biocombustíveis compete com alimentos e pode agravar a fome.
A revisão apresentada pelos autores mostra que essa narrativa é simplista. A segurança alimentar é um conceito afetado por múltiplos fatores estruturais, como desigualdade de renda e conflitos, e não apenas pela destinação de terras.
A experiência brasileira demonstra que é possível produzir energia e alimentos de forma complementar, utilizando sistemas de segunda safra, resíduos, e substituindo áreas de pastagem degradadas.
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Lições para a transição energética global
O estudo conclui que a transição energética deve ser guiada por neutralidade tecnológica e métricas reais de desempenho climático. As políticas devem recompensar as tecnologias que demonstrem a maior contribuição para a redução de GEE, alinhando metas climáticas à segurança energética e à justiça no comércio internacional.
Nos países tropicais em desenvolvimento, a biomobilidade – especialmente com veículos híbridos baseados em motores de combustão interna usando bioenergia – surge como uma alternativa estratégica de transição, escalável e de rápida contribuição para a descarbonização.
Para consolidar essa posição, o Brasil precisa intensificar uma diplomacia climática proativa para contestar critérios regulatórios arbitrários.
É essencial que o reconhecimento da bioenergia tropical seja priorizado em acordos internacionais, convertendo as vantagens comparativas (disponibilidade de terra, experiência e liderança tecnológica) em vantagens competitivas duradouras no mercado global.









