O mercado financeiro parece ver com bons olhos o segundo turno entre o ex-presidente Lula e o presidente Bolsonaro, definido neste domingo (2). A ideia é que o aperto na diferença entre os candidatos obrigue o vencedor a dialogar com outro lado e impeça arroubos de extremos à esquerda e à direita.
Na Bolsa, a perspectiva é de bom humor, na análise de Lucas Rocco, CEO da Wise Investimentos|BTG Pactual. No podcast do Monitor do Mercado desta segunda-feira (3/10), Rocco comenta que a necessidade de equilibrar os discursos dos candidatos deve animar o mercado, que está sempre em busca da maior estabilidade.
Os pontos que interessam aos grandes investidores estão bem definidos a essa altura das eleições.
Taxação de dividendos; respeito ao teto de gastos; garantia da autonomia do Banco Central; e abertura para privatizações estão no topo da lista dos interesses do mercado financeiro em relação às propostas dos candidatos à Presidência da República.
Lula e Bolsonaro concordam em relação a quase todos esses temas. O único ponto claro de divergência é a privatização da Petrobras.
O Monitor do Mercado levantou as posições dos presidenciáveis sobre os temas mais caros ao mundo dos investimentos, através de entrevistas, análise de programas de governo registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e de falas públicas dos candidatos.
Taxação de dividendos | Teto de gastos | Autonomia do Banco Central | Privatização da Petrobras | |
Lula | A favor | Contra | Já se pronunciou a favor, mas o tema ficou fora do plano de governo | Contra |
Bolsonaro | A favor | O teto seria apenas símbolo, de acordo com fala recente de Paulo Guedes | A favor | Já se pronunciou a favor, mas o tema ficou fora do plano de governo |
Entenda cada um dos temas e conheça a posição dos candidatos
Taxação de dividendos
Dividendos são uma parte do lucro das empresas que é distribuída aos seus acionistas. Atualmente, quem recebe dividendos não paga imposto de renda sobre eles. A justificativa para isso é que a empresa já pagou os impostos necessários para a geração de tal receita.
A proposta de cobrar um imposto de 15% sobre lucros e dividendos distribuídos pelas empresas a seus acionistas foi apontada como uma das prioridades para o governo Bolsonaro neste ano.
Recentemente, em evento público, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que pretende fazer a cobrança apenas para quem recebe mais de R$ 500 mil por mês, como distribuição de lucros ou dividendos.
Lula também não cita o tema em seu plano de governo, mas disse em evento neste ano que é preciso “desonerar o salário para onerar as pessoas mais ricas desse país”, complementando que “lucros e dividendos têm que pagar imposto de renda”.
Teto de gastos
O teto de gastos públicos foi criado em 2016, pela Emenda Constitucional 95. A norma limita o aumento de gastos do governo à variação no período. Ou seja: se a inflação, medida pelo IPCA, foi de 10% em um ano, o Orçamento poderá prever um aumento de 10% dos gastos no ano seguinte.
Entram nessa conta as despesas obrigatórias, como salários de servidores, seguros-desemprego e pensões; e as discricionárias, que são os investimentos públicos. Ficam de fora do teto repasses para estados e municípios, para o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica); o pagamento de juros da dívida pública; dinheiro aplicado em estatais; e gastos com eleições.
Ao estabelecer o teto, o então presidente Michel Temer justificou que essa seria uma forma de criar controle sobre as contas públicas, criando estabilidade e tornando o país mais atraente para investidores estrangeiros.
O teto, entretanto, foi furado já durante o governo Bolsonaro, sob a justificativa de que foi necessário ampliar os gastos do Estado para combater os impactos da Covid-19 na economia, como na distribuição de auxílios emergenciais.
Em evento em agosto, o ministro da Economia Paulo Guedes admitiu ter violado o teto de gastos, mas justificou que o teto deve existir como um símbolo. “Toda vez que tiver uma guerra ou pandemia, o teto é retrátil, o teto levanta”, afirmou.
Lula é declaradamente contra a existência do teto de gastos, afirmando que ele limita o crescimento da economia e a distribuição de renda.
Autonomia do Banco Central
A lei que determina a Autonomia do Banco Central foi sancionada por Jair Bolsonaro em 2021. Com a mudança, o presidente e os diretores do Banco Central passaram a ter mandatos de quatro anos — que não coincidem com os do mandato da Presidência da República — e não podem ser trocados sem motivos claros.
A justificativa para isso foi diminuir a influência política no BC, para que ele cumpra a sua função de garantir a segurança financeira e econômica do país, com o planejamento e execução das políticas monetárias.
A medida foi celebrada por economistas que apontaram a pressão política sobre o Banco Central como um dos principais motivos para a recessão sofrida pelo país em 2015 e 2016. Na época, o governo Dilma Rousseff fez com que o Banco Central segurasse artificialmente a taxa de juros em patamares baixos, ainda que o cenário exigisse o aumento da Selic para conter a inflação.
O tema não está citado no programa de governo petista entregue ao TSE, mas, em entrevista em janeiro deste ano, Lula se disse favorável à autonomia do BC. “As pessoas colocam obstáculos no tal do Banco Central independente. Olha, o BC tem que ter compromisso com o Brasil e não comigo”, afirmou.
Privatização da Petrobras
As privatizações são tema recorrente em campanhas presidenciais. A defesa delas costuma ter como base a ideia de que as empresas privadas têm gestão mais profissional e melhor desempenho no mercado, gerando mais riquezas para o país.
Em junho de 2022, a gigante da energia Eletrobras foi privatizada e movimentou R$ 33,7 bilhões com a venda da fatia que pertencia ao governo brasileiro, se desfez dos ativos na Bolsa de Valores. Seu valor de mercado hoje é de R$ 102 bilhões. Desde o dia da privatização, os papéis (ELET3) subiram cerca de 10%.
A Petrobras, maior estatal brasileira, está há tempos na mira de quem defende a desestatização da economia, mas é tida como polêmica por conta de sua posição estratégica para a produção de combustíveis no país. Atualmente, seu valor de mercado é de R$ 427 bilhões.
O presidente Bolsonaro já defendeu publicamente a privatização da petroleira. Em maio deste ano, ao comentar o tema, afirmou: “Se quiser privatizar, eu sou favorável”. A questão, no entanto, ficou fora do plano de governo com o qual concorre à reeleição.
Lula se posiciona claramente contra a privatização.
*Imagem: Elaboração própria, com imagens de divulgação