Fundador e CEO da plataforma de saúde Filóo, o executivo Rubem Ariano possui uma trajetória profissional peculiar. Com uma carreira de 18 anos na Hedging Griffo — na condição de sócio —, fez parte do time original do hoje badalado Fundo Verde juntamente com Luis Stuhlberger, profissional cujo nome, não raro, vem acompanhado de adjetivos como “lendário” e “maior gestor do País”.
Essa história de sucesso, no entanto, não foi suficiente para que ele seguisse em uma das casas mais reconhecidas do mercado financeiro. Inquieto e com um desejo de buscar algo “com impacto social”, deixou a empresa de finanças em 2010 para avaliar os próximos passos da carreira, criando um modelo de negócios que vem apresentando bons resultados e que possui um público estimado de 160 milhões de pessoas, entre aquelas que dependem praticamente apenas do SUS e as que buscam reduzir os custos com saúde, sobretudo nestes tempos em que o dragão da inflação está à solta.
“Tinha a sensação de dever cumprido no mercado financeiro e a clareza de que gostaria de atuar na ‘economia real’ e em uma atividade com impacto social”. Entre os três setores que cogitou inicialmente, saúde, educação e tecnologia, acabou optando pelo terceiro, lançando, em parceria com sócios, a entidade filantrópica Horas da Vida, na qual entrou inicialmente como sócio-investidor.
Marketplace
A ideia era simples: uma plataforma que unisse, de um lado, “horas de trabalho” de profissionais da saúde (daí o nome do projeto) e, do outro, um público totalmente dependente do SUS e, portanto, sem recursos para bancar tratamentos particulares. Nesse sistema, a “captação dos clientes” (justamente o público de baixa renda) viria por meio de outras ONGs, que já atendiam pessoas carentes. “Estávamos, na verdade, criando um marketplace de saúde gratuito, colocando, em uma mesma plataforma, as ONGs que trariam o público, os tomadores de serviço e os sellers, que atenderiam gratuitamente. Um modelo de negócios que se tornou relativamente comum nos anos seguintes, inclusive no varejo”.
Herança dos anos de atuação de Rubem no mercado financeiro, o modelo de negócios incluía, ainda, outros dois pressupostos: (1) o de que seria auditado por empresa independente e (2) o de que geraria receita para “andar com as próprias pernas”, não dependendo de doações. Assim, o Horas da Vida se especializou em fornecer projetos de saúde para empresas, remunerando-se com a cobrança de uma taxa de administração por esses serviços. A Hypera Pharma, por exemplo, contratou recentemente a ONG para um mutirão de saúde no estádio do Corinthians — que leva o nome da subsidiária da Hypera, a Neo Química. Outras empresas, como a Takeda Pharma, também já contrataram o serviço.
Prova de conceito
Em nove anos de existência, a ONG já viabilizou mais de 500 mil benefícios, entre consultas, exames, doações de óculos, medicamentos, cestas básicas e EPIs, impactando a vida de mais de 900 mil pessoas direta e indiretamente por meio dos projetos já realizados.
O Horas da Vida acabaria se tornando uma espécie de embrião da Filóo, que seria lançada em 2018, agora considerando um público mais amplo, das classes B-, C e D. “A ideia partiu de um mesmo modelo, de marketplace. Nesse sentido, o Horas da Vida acabou servindo como uma espécie de ‘prova de conceito’”, explica Rubem.
Lucro
Embora o DNA seja o mesmo, há algumas diferenças conceituais, já que a Filóo surgiu visando ao lucro, sem, portanto, uma conotação filantrópica. Aqui, no lugar das ONGs “geradoras de leads” (captadoras de público), entram empresas parceiras, que podem, em um primeiro modelo, apenas recomendar o serviço a seus funcionários — sem custo — e, em um segundo, contratar os serviços, seja como plano de saúde principal ou mesmo como um apoio (a um custo muito mais baixo) a um plano que a empresa eventualmente já ofereça, ajudando, por exemplo, a reduzir o absenteísmo e a sinistralidade desse plano já existente. Alguns dos parceiros da Filóo são 99, Rappi e Sumup.
Há, ainda, a possibilidade de os clientes contratarem o serviço diretamente (sem a intermediação de uma empresa parceira), com acesso a descontos em consultas, exames, vacinas e medicamentos, podendo contratar serviços adicionais para o cuidado com a saúde, com assinaturas mensais a partir de R$ 4,90. As consultas podem ser online, por telemedicina, ou presenciais, tendo a opção de contratar serviços à parte, como a telemedicina ilimitada, que funciona 24 horas por dia, sem necessidade de marcação.
Sem exclusividade
Diferentemente de outras empresas que oferecem serviços de saúde a baixo custo, a Filóo não possui exclusividade com um grupo de fornecedores, mas, em vez disso, convênios com grandes redes de laboratórios e serviços ambulatoriais de grandes hospitais, o que facilita para que os clientes encontrem serviços próximos de suas residências. Ao todo, são, atualmente, mais de 3 mil médicos credenciados e 15 mil farmácias que dão desconto. O mercado em potencial, como foi mencionado, chega a 160 milhões de pessoas.
Telemedicina
Tendo como foco desde o início na geração de receita, Rubem destaca que um dos segredos da gestão para oferecer custos tão acessíveis — entre os fornecedores de serviços de telemedicina está o renomado hospital Albert Einstein, por exemplo — está justamente em atuar, sobretudo, com o cuidado primário e fazer uso intensivo da tecnologia. “Nosso foco é na saúde primária, nos 85% dos casos ‘fora do hospital’, que não envolvem internação ou emergências”.
Ele destaca, ainda, que a estruturação do negócio seguiu a cartilha de criação dos marketplaces: “De 2018 a 2021, ajustamos a operação, com vários acertos e erros; em 2021 contratamos time e investimos em tecnologia. Depois, passamos a focar em parcerias e em escalar a operação. No atual momento, estamos ativando as bases dentro dos parceiros”. O total de clientes, destaca ele, cresceu oito vezes nos últimos seis meses.
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