O governo federal e lideranças do Congresso chegaram a um acordo neste domingo (8) para apresentar um pacote de medidas tributárias que substitua parte da arrecadação prevista com o decreto anunciado em maio, que aumentava o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
A proposta inclui o fim da isenção de Imposto de Renda (IR) para títulos como LCI, LCA, CRI, CRA e debêntures incentivadas, o aumento do imposto sobre casas de apostas (as chamadas bets) e a revisão de benefícios fiscais, entre outras medidas.
Com essas mudanças, o governo deve reduzir em um terço o impacto arrecadatório do decreto original, enquanto a expectativa inicial era de arrecadação de R$ 19,1 bilhões em 2025 e de R$ 38,2 bilhões em 2026.
Medidas alternativas ao aumento do IOF
Na proposta anunciada neste domingo, as medidas alternativas ao texto do decreto incluem:
- Fim da isenção de Imposto de Renda para LCI, LCA, CRI, CRA e debêntures incentivadas
- Aumento da alíquota sobre apostas online (bets) de 12% para 18%
- Corte de 10% em benefícios fiscais fora da Constituição
- Redução de IOF em operações de crédito e investimentos
- Exclusão das fintechs do regime especial da CSLL
- Revisão de isenções para previdência e fundos de crédito
O governo também propôs um corte linear de 10% sobre incentivos fiscais não previstos na Constituição. Ficam fora da medida: cesta básica, Simples Nacional e Zona Franca de Manaus.
Segundo Simone Deos, Conselheira do Corecon-SP, as novas medidas anunciadas devem ajudar ao não encarecer as operações de crédito para as empresas e promover certo alívio para os consumidores finais.
Ela também considera que essas medidas sejam mais efetivas que as apresentadas anteriormente e reduzem muito as chances de resistência pelo Congresso, uma vez que já houve as negociações entre o executivo e o legislativo, evidenciando também a pertinência política na discussão dessas medidas.
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Pacote substituirá parte do aumento do IOF
O novo pacote será apresentado por meio de uma Medida Provisória (MP), que entra em vigor imediatamente, mas precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional. A ideia é que ele substitua parte da arrecadação prevista com o aumento do IOF, cuja validade ficou fragilizada após críticas de diversos setores.
Entre os pontos que devem ser revistos, segundo o Valor Econômico, estão:
- Redução do IOF sobre crédito para empresas;
- Redução de 80% na cobrança sobre operações de risco sacado (antecipação de pagamento a fornecedores);
- Redução do IOF nos planos de previdência VGBL;
- Isenção de IOF sobre o retorno de investimentos estrangeiros diretos;
- Cobrança mínima de IOF sobre Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC).
Durante as negociações, foram levantadas propostas para revisar regras do Fundeb (educação básica) e do Benefício de Prestação Continuada (BPC), mas esses pontos ficaram fora do texto da MP, por falta de consenso político.
Fim da isenção para LCI, LCA, CRI e CRA
Hoje isentos de IR, os títulos de Letras de Crédito Imobiliário (LCI), Letras de Crédito do Agronegócio (LCA), Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI), Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) e debêntures incentivadas passarão a ser tributados em 5%, segundo apuração do Valor Econômico.
Essa tributação, no entanto, valerá apenas para novos papéis emitidos, a partir de 2026, respeitando o princípio da anterioridade. Quem já possui esses títulos não será afetado.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que os “Títulos isentos vão deixar de ser isentos, mas continuarão bastante incentivados”, e que a diferença de zero para 17,5% será reduzida para 5%. Declarou, ainda, que a medida visa corrigir “distorções no mercado de títulos e valores mobiliários”.
Simone Deos analisa essa mudança na cobrança de imposto como uma iniciativa para reduzir o “incentivo imenso para emissão desses títulos, que atualmente causam distorção em relação a outros”.
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Eduardo Diamantino, tributarista do Diamantino Advogados Associados, defende que a extinção da isenção das LCAs e LCIs tirará boa parte da atratividade que existia nesse tipo de título.
“Vai atrapalhar as duas pontas: os aplicadores, que passam a ter o ganho tributado, e os tomadores, visto que haverá menos recursos disponíveis e as taxas podem subir. O aplicador vai querer repassar esse aumento nas taxas”, completa.
Ele explica que quem recebia 95% do CDI sem imposto vai buscar um ativo que mantenha essa rentabilidade.
Fim de isenção para LCIs deve impactar o setor
Segundo o presidente da Câmara, Hugo Motta, há um consenso de que o nível dos benefícios tributários está muito exagerado para o país. “Esse corte [de isenções] ainda será discutido e debatido. Existe uma sugestão do governo para cortar 10% para o ano que vem”.
Em manifestão ao anúncio das medidas, a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), declarou que o fim de isenção nas LCIs pode impactar financiamento de imóveis.
Enfatizou que as LCIs têm papel relevante para sustentar mercado de crédito imobiliário e não devem ser analisadas apenas pela ótica de investimento.
No âmbito dos investimentos, José Rubens Constant, Advogado Especialista em Direito Tributário do escritório JLegal Team, analisa que a decisão em tributar essas aplicações pode desestimular investidores em suas escolhas, e acarretar a migração de seus investimentos para outras aplicações isentas.
Segundo ele, a tributação de LCI, LCA, CRI e CRA marca uma mudança de paradigma: de um modelo de incentivos fiscais setoriais para um modelo de ampliação da base tributária.
Como consequência disso, haveria uma diminuição no financiamento dos setores imobiliários e do agronegócio e um possível aumento do custo de crédito para os tomadores finais.
“Embora legítimo do ponto de vista fiscal, esse movimento precisa ser compensado com políticas de crédito específicas para não prejudicar setores-chave da economia brasileira”, diz Constant.
IOF não será reduzido para offshores e fundos exclusivos
O decreto original previa aumento generalizado das alíquotas de IOF. Após reação negativa de agentes econômicos e juristas, o governo vai manter apenas a alta sobre investimentos no exterior via offshores e fundos exclusivos, recuando nas demais operações.
Raphael Okano Oliveira, advogado especialista em Direito Tributário e sócio do CTM Advogados, enfatiza que a função do IOF é regulatória, não arrecadatória. “Aumentar alíquota para fazer caixa é desvio de finalidade e pode ser considerado inconstitucional”.
Na última semana foi ajuizada uma Ação Direta de Inconstitucionalidade pelo Partido Liberal (PL) no Supremo Tribunal Federal (STF), a qual poderia culminar com a suspensão e, mais à frente, com a declaração de inconstitucionalidade do Decreto.
Oliveira chama atenção para a falta de objetividade nos anúncios das medidas alternativas ao IOF e para o fato de serem medidas que demorarão a entrar em vigor. “Grande parte delas apenas poderá surtir efeitos no próximo ano, não resolvendo o rombo fiscal de 2025”, pontua.
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Fim da alíquota reduzida para fintechs
A MP também prevê o fim da alíquota reduzida de CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) para fintechs, hoje em 9%, alinhando o setor às instituições financeiras tradicionais, com alíquota de 20%.
Para Constant, a medida tende a aumentar o custo das fintechs e pode afetar a competição com os bancos.
“A decisão de equiparar as fintechs aos bancos tradicionais (com alíquotas de 15% ou 20%) deve ter implicações relevantes tanto para o setor financeiro quanto para o ambiente concorrencial, podendo desacelerar o setor e aumentar a barreira de entrada, além de causar um aumento no preço dos serviços e produtos ofertados”, afirma.
Apostas online terão imposto maior
O governo retomou a proposta original de tributar em 18% o GGR (Gross Gaming Revenue) das bets — casas de apostas online. A alíquota havia sido reduzida para 12% durante tramitação legislativa, mas será reajustada via MP.
Constant explica que embora o aumento na tributação das Bets seja de 50%, o aumento não deve impactar negativamente o setor em sua atuação no país.
Já a conselheira do Corecon-SP pontua que o aumento dos impostos sobre bets parece uma medida interessante no sentido de não incentivar e regular as apostas online dado o contexto atual com impactos nocivos das bets no envidivamento das famílias.
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Críticas do presidente da Câmara às alternativas do IOF
Durante o encontro Agenda Brasil — sobre o cenário fiscal brasileiro promovido pelo Valor Econômico nesta segunda-feira, Hugo Motta afirmou que as medidas da MP são menos danosas que o aumento do IOF e que a redução de benefícios fiscais não deve ser um tema fácil de aprovação.
Ele também ressaltou que o Congresso não está vinculado a aprovar a medida provisória que o governo pretende editar para substituir a arrecadação prevista com o decreto do IOF. Segundo ele, o texto que está sendo elaborado pela equipe econômica ainda será analisado pelo Legislativo, que poderá fazer alterações ou rejeitar trechos.
No evento, Motta criticou a ausência de propostas para corte de gastos públicos e o uso excessivo de medidas com foco apenas em arrecadação: “Há um esgotamento no país sobre medidas que aumentem arrecadação. Não dá para esperar o próximo Congresso ser eleito para tratar do debate sobre medidas estruturantes”.
Motta também defendeu um corte mais amplo em isenções e anunciou que apresentará, em julho, um esboço da reforma administrativa.