Às vésperas da COP 30, que reunirá líderes de todo o mundo no Brasil em novembro para discutir o futuro ambiental do planeta, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva é acusado pelo jornal econômico alemão Handelsblatt de fazer “jogo duplo” em relação à exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas.
Segundo o jornal, Lula estaria adotando uma estratégia arriscada: impulsionar a exploração de petróleo na área de ecossistema sensível e de alta biodiversidade, sem abrir mão do discurso de liderança climática que tem rendido ao Brasil prestígio nas negociações ambientais globais.
A publicação chama a postura do petista de “jogo duplo”, sugerindo que o governo tenta conciliar interesses econômicos e compromissos ambientais em um momento em que cada gesto será observado e cobrado pela comunidade internacional.
COP 30: vitrine ambiental e palco de cobrança
A COP 30, conferência da ONU sobre clima, será realizada em novembro, em Belém (PA). O evento colocará o Brasil no centro das atenções globais, oferecendo a Lula a chance de reforçar a imagem do país como potência verde.
Mas, segundo o jornal econômico alemão Handelsblatt, essa vitrine internacional pode se transformar em um palco de cobranças, pela crescente pressão do governo para explorar reservas de petróleo na foz do Amazonas — justamente na região onde a conferência será sediada.
Decreto abre caminho para megaprojetos
O Handelsblatt destaca que Lula aprovou, por decreto, um mecanismo que acelera o licenciamento de projetos estratégicos — como infraestrutura, mineração, gás e, especialmente, petróleo — mesmo em áreas de alto risco ambiental.
A medida surgiu a partir da polêmica Lei de Simplificação do Licenciamento Ambiental, apelidada por ambientalistas de “Lei da Devastação”. Aprovada a toque de caixa na Câmara dos Deputados, com apoio de mais de dois terços dos parlamentares, a lei recebeu vetos parciais de Lula. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, se posicionou totalmente contra a matéria.
O presidente, no entanto, manteve o ponto que destrava obras prioritárias, transformando-o em decreto, que entrou em vigor imediatamente. Com isso, Lula atendeu à pressão de líderes do Congresso, como o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, e de ministros favoráveis a “tratamento especial” para grandes projetos.
O petróleo como ouro negro da foz do Amazonas
A reportagem alemã lembra que a foz do Amazonas pode esconder reservas gigantescas de petróleo, comparáveis às que transformaram a vizinha Guiana em um novo player global do setor.
A Opep projeta que a produção brasileira salte de 4,2 milhões para 5,8 milhões de barris por dia até 2030, o que colocaria o Brasil no 4º lugar entre os maiores produtores de petróleo do mundo.
Mas esse avanço contrasta com a imagem verde que o governo tenta consolidar. Hoje, 90% da eletricidade brasileira vem de fontes renováveis, e o país atua como mediador entre nações desenvolvidas e em desenvolvimento nas negociações climáticas.
A disputa de narrativas sobre o petróleo
Os defensores da exploração do petróleo no Amazonas argumentam que:
- As reservas atuais atingirão o pico de produção até 2030.
- O projeto traria empregos e infraestrutura para uma das regiões mais pobres do país.
- As receitas poderiam ajudar a reduzir a dívida pública e financiar saúde, educação e transição energética.
Os críticos afirmam que:
- O risco ambiental é alto para ecossistemas pouco estudados, como recifes de corais e manguezais.
- Um acidente poderia ter consequências irreversíveis, com planos de contingência da Petrobras considerados insuficientes.
- Povos indígenas não foram consultados adequadamente, violando normas legais.
Pressão sobre o Ibama
Até agora, o Ibama resiste e nega autorização para perfurações de teste na região. Mas a flexibilização do licenciamento e a criação de mecanismos de priorização aumentam a pressão política para liberar as atividades.
Para o Handelsblatt, esse é o cerne do “jogo duplo” de Lula: garantir novos investimentos e arrecadação, ao mesmo tempo em que tenta preservar o discurso de liderança climática. A tensão entre esses dois objetivos deve ganhar ainda mais destaque conforme a COP 30 se aproxima — e o mundo volta os olhos para Belém.