Mesmo diante de um cenário de juros altos e ameaças inflacionárias, o segmento de venture capital segue como uma boa oportunidade para investidores – desde, é claro, que o investimento seja feito a partir de uma avaliação mais criteriosa do potencial das empresas investidas. Na outra ponta, a das empresas investidas, ainda há acesso a recursos, contanto que os projetos sejam, de fato, viáveis – ou usando uma expressão do mercado, que “parem em pé”. Essa é uma das principais lições do OurCrowd Global Investor Summit 2023, evento promovido de 12 a 17 de fevereiro em Tel Aviv e Jerusalém pela gestora OurCrowd, a maior do país do Oriente Médio.
O evento um dos maiores da área de VC de todo o Planeta, reuniu todo o “ecossistema” do setor, com cerca de 700 gestores do mundo todo, 945 empreendedores e 1,1 mil representantes de grandes multinacionais, em um total de 30 “mini-eventos” e 5 mil reuniões de relacionamento.
Tendências
Em um dos painéis de destaque, Stav Erez, sócia da incubadora Labs/02 e Eli Nir, sócio sênior da área de investimentos da OurCrowd Israel apresentaram 10 das principais tendências tecnológicas para investimentos de VCs para 2023. São elas:
(1) fusão nuclear, a partir de plantas compactas e mais seguras – para se ter uma ideia, a energia produzida com um único quilo de combustível de fusão produz a mesma quantidade de energia produzida por 10 mil toneladas de combustíveis fósseis e sem resultar em lixo radioativo. Uma das startups que trabalha com a tecnologia é a americana Commonwealth Fusion Systems, ligada ao MIT e que está atuando para produzir essas usinas em um modelo escalável e Nt-Tao, israelense do portfólio da OurCrowd que está atuando para produzir energia por fusão fusão nuclear em containers.
(2) negócios ligados a tecnologias espaciais – já há startups desenvolvendo foguetes, habitações e sistemas capazes de extrair metais e oxigênio do solo lunar e de Marte. Uma dessas empresas, a ICON, já fechou um contrato de US$ 57 milhões com a Nasa para a construção de uma base lunar. Outro exemplo, é Ursa Major, portfólio da OurCrowd que produz motores para foguetes impressos em 3D, com receita contratada de centenas de milhões de dólares.
(3) healthcare – cuja evolução digital inclui, cada vez mais tecnologias como AI, análise de dados e cloud. A startup OncoHost utiliza IA e proteômica (uma área de biologia molecular) para testes preditivos em relação aos possíveis cenários em um tratamento oncológico.
(4) tecnologias para a redução das emissões ou captura de carbono – a Blue Green Water Tehnologies, por exemplo, desenvolveu uma tecnologia para, por meio de cianobactérias, retirar grandes quantidades de carbono da atmosfera.
(5) foodtech – proteínas alternativas, substitutas de carne bovina, frango e outras, estão revolucionando a alimentação. A americana EVERY COMPANY, uma investida da OurCrowd, vem produzindo “ovos plant based” a partir de um trabalho de “fermentação de precisão”, em um processo que exige menos recursos naturais que a criação de galinhas. A empresa já recebeu investimento da atriz Anne Hathaway.
(6) armazenagem de energia produzida por energias alternativas – a empresa NewGen, por exemplo, desenvolveu pequenos “packs” de armazenagem de energia de hidrogênio (semelhantes a cápsulas de Nespresso) que poderão ser usadas como baterias em diversos dispositivos.
(7) especialização no uso de dispositivos de silício – a crise no fornecimento de chips ocorrida em 2021, durante a pandemia, provocou perdas de dezenas de milhões de dólares. O chamado “silício sob medida” poderá atacar essa questão. A startup NeuReality, por exemplo, está desenvolvendo um chip a partir de IA com enorme capacidade de escalabilidade.
(8) inteligência artificial (IA) generativa – o sistema ChatGPT (e outros na mesma linha) é capaz de criar músicas, textos e até mesmo programar a partir de comandos. A D-ID, empresa do portfólio OurCrowd, digitaliza pessoas e hoje é considerada a plataforma “cutting hedge” do universo de IA Generativa, tendo digitalizado em 2022 mais de 100 milhões de vídeos. Estima-se que até 2030 90% do conteúdo online será feito por IA generativa. Outro exemplo é a Dynamics, que criou um modelo de IA generativa capaz de apoiar empresas de propaganda na produção de conteúdo publicitário relevante.
(9) Metaverso – embora haja questionamentos sobre o futuro dessa tecnologia, muitas empresas estão apostando no metaverso, mas com uma abordagem mais voltada para negócios. A Surgical Theater, por exemplo, criou, a partir de ferramentas que utilizam 3D, o Medaverse (termo que combina “Medicina” com “Metaverso”), permitindo cirurgias também em 3D.
(10) tecnologias contra o desmatamento – atualmente, o planeta replanta, por ano, apenas metade das árvores que são perdidas. A startup canadense Flash Forest desenvolveu um sistema de drones que, literalmente, “atira” sementes para replantar florestas, sobretudo aquelas perdidas por queimadas. As sementes não são lançadas diretamente no solo, mas em envolvidas em pequenos pacotes contendo nutrientes e até mesmo bactérias benéficas para se desenvolverem. Essa também faz parte do portfólio OurCrowd.
Delegação brasileira
O Brasil participou do OurCrowd Global Investor Summit com uma delegação composta por 15 pessoas, entre alocadores de capital (basicamente, gestoras de wealth managent), empreendedores seriais e representantes da operação local da OurCrowd.
Foram nove visitas a empresas de alta tecnologia investidas da OurCrowd, como, por exemplo, a Air EV, startup israelense responsável pelo desenvolvimento de um eVtol – sigla, em inglês que remete a “veículo elétrico voador capaz de realizar pousos e decolagens na vertical” e que já está em fase avançada de desenvolvimento, com 400 pré-ordens de compra, todas provenientes dos Estados Unidos e previsão de entrega das primeiras unidades a partir do segundo semestre do ano que vem.
Entre as palestras e workshops, o evento contou com temas que remetem à tecnologia e que já recebem investimentos de VC, tais como tecnologias de emissão zero (como hidrogênio verde), robôs criados para ajudar pessoas idosas e as já mencionadas food techs – com a apresentação de um chef preparando, no palco do evento, pratos à base de salmão e cordeiro, ambos em versão “plant based” e “cell based”, sendo “julgados” por Michal Ansky, apresentadora da edição local do programa Master Chef.
MBA
“Ficou claro, mais uma vez, que, apesar do cenário desafiador do ponto de vista da oferta de funding, as boas empresas e as boas soluções continuam existindo, gerando receita, crescendo a dois dígitos e, sobretudo, desenvolvendo soluções inovadoras, uma característica do universo do venture capital. Foi o primeiro summit pós pandemia, com uma enorme importância, na medida em que reuniu investidores, empreendedores e representantes de grandes corporações”, explica Nathalia Santos, sócia da OurCrowd no escritório do Brasil.
Ela explica, ainda, que, para os participantes brasileiros, o evento foi “mindblowing”, no sentido de dar a acesso a novas experiências e cases de sucesso únicos no mundo. “Eles tiveram a oportunidade de participar de mesas redondas sobre diversos temas que foi um verdadeiro ‘MBA de uma hora’”.
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