As relações do Brasil com outros países devem ser prioridade nas negociações das tarifas entre setores do agro com os Estados Unidos, segundo Alfredo Miguel, Diretor de Assuntos Corporativos, Comunicações e Cidadania para a América Latina da John Deere.
“Temos que sentar na mesa com as cartas abertas e discutir nossa situação no BRICS, a relação com o Irã, a comunidade europeia, o Canadá e a importação da Rússia. Muitas vezes a gente olha e culpa as tarifas, mas acredito que elas sejam consequência de algo que já não está indo muito bem”, disse.
A discussão foi levantada durante o 24º Congresso Brasileiro do Agronegócio, promovido pela Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG) e pela B3, e realizado nesta segunda-feira (11), em São Paulo.
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Miguel também ressaltou a necessidade de reorganização do setor privado: “Nós como empresa privada temos que tentar nos organizar em termos de custo, cadeia de fornecimento e exportação para continuarmos competitivos.”
“É importante que o governo tenha um plano de curto e médio prazo para seguirmos competitivos juntos. O agro precisa liderar o Brasil com ciência, tecnologia e inovação para continuarmos nessa crescente expansão do setor”, completou.
COP 30 como oportunidade para o mercado internacional
O CEO da Bayer Brasil e Presidente da Divisão Crop Science Brasil, Márcio Santos, apontou a COP 30 como uma oportunidade para reposicionar o Brasil no cenário internacional; disse que o evento pode abrir caminhos para dialogar com novos parceiros e mostrar que o Brasil é um parceiro comercial confiável.
Ainda, reforçou a importância dos investimentos contínuos em inovação para o crescimento do agro. Segundo ele, o país deve refletir sobre sua capacidade interna:
“Se o cenário externo se resolvesse hoje, nós estaríamos preparados para atender o mercado global? Será que o que construímos ao longo dessas décadas, ainda estamos mantendo? Essas perguntas são fundamentais porque temos que acreditar que podemos manter nossa trajetória de crescimento.”
Santos também alertou para os desafios internos: “Na minha opinião, falta ambiente institucional para sermos mais competitivos. Deixo aqui uma reflexão sobre o que já construímos nestes últimos 50 anos e como vamos pensar os próximos anos e esta trajetória do agro.”
Bruno Gomes, Superintendente de Securitização e Agronegócio da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) confirmou que há uma expectativa das empresas para a COP 30 e ressaltou que a COP não termina em Belém, mas começa. “Depois, temos 1 ano de presidência onde a gente vai fazer o pós-COP 30.”, completou.
Diversificação do agro como base da resiliência
O CEO Global da JBS, Gilberto Tomazoni, apontou a diversificação como elemento fundamental para superar ciclos e desafios globais:
“Reconhecemos que o ciclo das commodities existe; essa estratégia de diversificação foi construída pensando no ciclo das commodities, nos problemas sanitários que podem acontecer, nos problemas autárquicos e nos problemas tarifários. E quando eu vejo isso que está acontecendo, penso que nós temos que reforçar ainda mais a plataforma, focar em crescer mais e diversificar mais”, enfatiza.
Tomazoni também ressaltou que o Brasil tem vantagem competitiva nas negociações, considerando o contexto de segurança alimentar. “Nós estamos falando de 2,3 bilhões de pessoas no mundo em severa ou moderada de insegurança alimentar e temos essa vantagem competitiva.”
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China, EUA e o desafio da dependência
Larissa Wachholz, Senior Fellow do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI) mencionou o cenário de dependência de determinados mercados e alertou para o desconforto da China com a dependência das importações do Brasil e dos Estados Unidos.
Segundo ela, o cenário de tarifas sobre exportações já havia sido mapeado pelo CEBRI, principalmente no início do segundo mandato do presidente Donald Trump e também estava no mapeamento dos chineses.
No entanto, a relação comercial do Brasil e da China mudou, o Brasil passou a ter uma posição mais importante de fornecedor e nossa competitividade passou a ser óbvia também para os chineses. Larissa ressalta dados recentes de que atualmente o Brasil forneceu à China aproximadamente 70% de tudo o que ela importa em soja (cerca de 100 milhões de toneladas), enquanto em 2024 os EUA representaram aproximadamente 21% do total que a China importou.
Ela relembra ainda que acerca do “Dia da Libertação”, a Associação de Produtores de Soja de Illinois publicou uma nota dizendo que o Brasil seria o maior beneficiado da guerra tarifária, já prevendo a busca da China pela diversificação e redução da dependência externa, inclusive por meio da redução do uso de farelo de soja e aumento da produção nacional.
Larissa finaliza alertando para que o Brasil deva também adotar essa medida: “Precisamos pensar em nossas dependências como país, seja em fertilizantes ou outros insumos, e nos beneficiar da inovação e diversidade dos parceiros, sem privilegiar um ou outro. É preciso desenvolver novos mercados e não vender barato. Olhar para o mundo, entender suas necessidades e complementar um ao outro.”
Mercado de capitais e financiamento ao agro
O evento também destacou o papel crescente do mercado de capitais para financiar o agronegócio, incluindo o avanço dos Fiagros (Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais).
Bruno Gomes apontou que “o agronegócio representa 25% do PIB, mas apenas 3,5% do mercado de capitais. O potencial de crescimento é enorme. Hoje já temos mais de 100 Fiagros, com aproximadamente R$ 40 bilhões em patrimônio líquido e cerca de 650 mil investidores pessoas físicas.”
Para ampliar o acesso ao crédito, especialmente para pequenos e médios produtores, Raphael Silva de Santana, gerente nacional de Agronegócios do Sicoob, destacou a importância do cooperativismo financeiro: “O subsídio público não vai financiar sozinho o produtor. O cooperativismo e o mercado de capitais podem levar crédito a quem está fora do sistema tradicional.”
“Hoje nós temos mais de 3.200 agências trabalhando com crédito rural. A gente tem que usar o digital para a gente agilizar, para a gente conseguir fazer com que o crédito chegue mais rápido. Quando pegamos o cooperativismo de crédito, a gente consegue chegar em uns lugares onde o sistema financeiro não chega”, completou.
Bruno Santana, CEO e fundador da Kijani Investimentos, comentou que o advento de Fiagro possibilitou uma questão única, que são gestores profissionais aproximando investidores que conhecem pouco do agronegócio brasileiro com empresas com potenciais emissores que não tinham ainda o tamanho, o profissionalismo, a governança para fazer isso de maneira autônoma.
Flavia Palacios, Diretora da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (ANBIMA), enfatiza que a liberação de créditos pelo mercado de capitais foi uma grande evolução e que vêm sendo desenvolvidos instrumentos para trazer o investidor de mercado de capitais para contribuir de uma forma efetiva no crédito do agronegócio.
A diretora da ANBIMA ressalta que após instrumentos genéricos, instrumentos imobiliários, certificados de recebimento do agro, como CPR, CDCA e outros chamaram a atenção de pessoas físicas para investirem em instrumentos que levassem crédito para o agro.
Já Luiz Masagão, vice-presidente de Produtos e Clientes da B3, ressaltou a necessidade de atrair capital institucional para o setor.
Segundo ele, em algum momento o atual ciclo de investimentos de pessoas físicas no agro, no imobiliário e na infraestrutura terá um limite. Por isso, é preciso saber como atrair também de uma forma competitiva com taxas competitivas o mercado de previdência para sustentar o crescimento do setor.
“Então, acho que a hora que o agro chegar a 10% do PIB, talvez seja viável com esses incentivos de pessoas físicas, mas além disso, a gente precisa de fundos de pensão. Ninguém quer acabar com o seu do crédito fraco, todos querem potencializar o orçamento”, complementou.
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Infraestrutura, institucionalidade e tecnologia no agro
Alfredo Miguel lembrou que o Brasil conta com um ambiente institucional e uma infraestrutura que sustentam a competitividade do setor, com leis que funcionam pelo que se possa imaginar, como serviços financeiros, CPR, lei de semente, de químico, de máquina, entre outros.
“A geração que me antecedeu construiu um ambiente institucional invejável, com leis, serviços financeiros e infraestrutura, como energia e portos, que sustentam a agricultura profissional empresarial brasileira.”
Ele alertou para a necessidade de se preservar esse ambiente: “O dilema da abundância é que quando você é competitivo, começam as brigas internas. Precisamos discutir crédito, regulação e legislação para manter a competitividade para os próximos 50 anos.”
Bruno Santana destacou que o agro brasileiro já opera com tecnologia de ponta e armazenamento: “Hoje o Brasil tem 60% da sua capacidade produtiva em armazenamento, o que é metade do indicado pela FAO. Temos instrumentos financeiros, estrutura e logística para seguir avançando.”