O Índice de Burocracia 2024 aponta que o Brasil perde o equivalente a 13% das exportações anuais, cerca de US$ 50 bilhões, com trâmites para abrir e manter empresas. Apesar de avanços na digitalização, gargalos regionais e municipais ainda pesam sobre a produtividade.
A economista Sari Levi Carciente, pesquisadora do Smith Center for Economic Freedom da Universidade Internacional da Flórida (EUA), apresentou no Brasil os resultados do índice, que analisa como pequenas e médias empresas enfrentam processos administrativos para operar de forma legal na América Latina.
Em entrevista ao Canal Um Brasil, uma realização da FecomercioSP, a economista explica que o índice mede duas variáveis principais: o tempo para abrir uma empresa e as obrigações anuais para manter o negócio formal.
O Monitor do Mercado teve acesso exclusivo à entrevista e traz, em primeira mão, dados do estudo com foco nas pequenas empresas, que representam 90% do total na região, e nas atividades produtivas mais relevantes de cada setor econômico em cada país.
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Brasil abaixo da média regional, mas possui desafios com burocracia
Segundo Levi Carciente, as diferenças entre países estão ligadas tanto à natureza dos setores produtivos como às exigências regulatórias específicas. Há nações que avançaram na agilização burocrática em nível nacional, mas ainda enfrentam entraves regionais e setoriais.
No Brasil, o tempo médio para abrir uma empresa é de 618 horas, inferior ao da Argentina (2 mil horas). A economista destaca que, anos atrás, o país aparecia mal posicionado em levantamentos como o Doing Business, quando levava cerca de 1500 horas para abrir uma empresa, mas houve progresso com processos de digitalização e simplificação.
“O Brasil se encontra dentro do bloco por baixo da média, o que é uma boa notícia. Mas isso não significa que vamos relaxar. Significa que fizemos algum progresso, mas ainda há muito a fazer, uma vez que as diferenças regionais podem ser muito importantes e por vezes não aparecem nessa média onde o país se encontra”, afirmou Levi Carciente.
Ela explica que, enquanto os trâmites nacionais são mais rápidos, certas atividades em regiões específicas continuam demoradas. Um exemplo são os pagamentos de impostos, que envolvem sobreposição de obrigações federais, estaduais e municipais, o que significa que ainda há muito o que ser melhorado.
Burocracia municipal pesa mais no Brasil
Geralmente, em países mais burocráticos, a dificuldade dos processos pode estar associada a vários motivos, como a atividade econômica escolhida ou à falta de processos de digitalização das fases burocráticas para abertura de empresas.
Para Levi Carciente, antes de digitalizar é necessário agilizar o processo e excluir etapas desnecessárias, a fim de aumentar a produtividade da empresa, permitindo seu crescimento, gerar mais empregos, formalizar as atividades e evitar que a corrupção se desenvolva nesse âmbito.
Ela complementa que a desburocratização vai além da questão dos processos, diz respeito ao desenvolvimento e à liberdade do país.
Segundo dados de 2024, no Brasil há mais obrigações burocráticas ligadas às administrações municipais que no âmbito federal, com licenças, renovações e mudanças frequentes em exigências e formatos de documentos. Isso também ocorre em países como Costa Rica e Paraguai.
A economista esclarece que muitos processos de modernização começam no nível nacional, mas não chegam ao nível local, além da morosidade dos processos.
Nessas instâncias, há exigências que se encadeiam no processo de autorização para funcionamento de uma empresa. como o alvará do Corpo de Bombeiros, renovações de licenças, certificações e mudanças na legislação local, como novos documentos ou alterações de formato, também aumentam o tempo e o custo para as empresas.
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Burocracia acarreta custo bilionário para a economia
O estudo mostra que a burocracia para abrir e manter empresas no Brasil consome o equivalente a 13% do valor anual das exportações, cerca de US$ 50 bilhões.
“Isso significa que, em vez de produzir, uma parte relevante do tempo e dos recursos está sendo dedicada a trâmites burocráticos”, disse a economista.
Para pequenas empresas, o custo é ainda mais significativo, uma vez que o tempo que se decida a burocracias não é quantificado, uma vez que muitas vezes o proprietário precisa dedicar tempo a processos administrativos em vez de atender clientes ou expandir o negócio.
Segundo Levi Carciente, nos tempos atuais em que os países buscam aumentar o desenvolvimento, esses impactos são inaceitáveis.
Empresas pagam mais para permanecerem ativas
A pesquisa também revela que, em alguns países, a abertura de empresas é relativamente simples, mas a manutenção exige muito mais tempo. É o caso da Colômbia, que está na média regional para abrir empresas, mas lidera no número de obrigações para mantê-las ativas.
“A maior parte das reformas se concentrou na abertura de empresas, mas as operações para manter o funcionamento ficaram um pouco esquecidas. As empresas, uma vez abertas, reclamam da quantidade de processos que precisam realizar para se manterem”, observou Levi Carciente.
Na Colômbia, por exemplo, a maior parte do tempo é dedicada à administração de empregos, sobretudo no setor primário, quando manter funcionários em atividades irregulares requer outros procedimentos distintos.
“Na Colômbia e no Peru pequenas empresas chegam a contratar dois funcionários apenas para lidar com questões burocráticas, o que significa que empresas pequenas têm um custo muito elevado”, analisa.
Gastos burocráticos seguem ocultos
A especialista chama atenção para o fato de que alguns regulamentos impedem a aplicação de outras políticas. Ela cita como exemplo, políticas de combate à informalidade que dificultam a formalização de uma empresa.
Enfatiza ainda que fala-se muito na abertura e no financiamento de empresas, mas as grandes despesas com procedimentos burocráticas ficam como custos ocultos.
Segundo a economista, a burocracia surgiu com propósito positivo, de organizar a relação entre Estado e cidadãos, mas seu crescimento excessivo e a intromissão em áreas que não lhe cabem criaram barreiras ao desenvolvimento.
Ela cita que algumas regras, como normas de saúde pública, têm sentido, mas outras chegam a interferir em questões como gestão de férias ou afastamentos por doença de funcionários.
Segundo Levi Carciente, com o intuito de servir como uma orientação tanto para o empreendedor como para o autor de políticas públicas, o índice cruza dados por país, por setor econômico, por tipo de trâmite e identifica os órgãos e leis que impõem cada obrigação, oferecendo subsídios para governos e empresas encontrarem soluções.
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Caminhos para reduzir os problemas burocráticos
Levi Carciente ressalta que o Brasil já mostrou avanços nos últimos cinco anos, mas ainda há espaço para melhorias.
Para lidar com o excesso de burocracia, ela sugere:
- Eliminação de trâmites excessivos e intrusivos.
- Digitalização eficiente, com plataformas amigáveis e rastreamento de processos.
- Educação de empresários sobre direitos e capacitação de servidores públicos.
“Tecnologias não são mágicas, mas, bem aplicadas, ajudam a ampliar a liberdade do cidadão ao invés de controlá-lo”, concluiu.
Assista à entrevista na íntegra, com Sari Levi Carciente, pesquisadora do Smith Center for Economic Freedom da Universidade Internacional da Flórida (EUA), ao Canal Um Brasil, uma realização da FecomercioSP: