Você e um amigo pesquisam o mesmo voo, no mesmo instante, e recebem preços diferentes na tela. O valor daquele produto que você namora em um site de e-commerce muda misteriosamente da manhã para a tarde. Coincidência? Erro do sistema? Não. Bem-vindo à era da precificação dinâmica, uma estratégia movida por inteligência artificial (IA) que está transformando o conceito de “preço fixo” em uma relíquia do passado.
Essa tecnologia, que já domina setores como o de viagens e transporte por aplicativo, avança rapidamente sobre o varejo online e até mesmo sobre as gôndolas dos supermercados. Entender como ela funciona é o primeiro passo para não ser pego de surpresa e garantir que você está pagando o preço mais justo.
O que é a precificação dinâmica e como a inteligência artificial comanda o show?

Em resumo, precificação dinâmica é a estratégia de não ter um preço fixo para um produto ou serviço, mas sim um preço fluido, que se adapta em tempo real a uma série de variáveis. O motor por trás dessa agilidade é a inteligência artificial.
Algoritmos de IA são capazes de analisar um volume gigantesco de dados a cada segundo para calcular o preço “ótimo” – o valor máximo que o mercado (ou até mesmo um consumidor individual) está disposto a pagar naquele exato momento. É uma busca constante pelo equilíbrio perfeito entre maximizar o lucro e não perder a venda para um concorrente.
Quais são os ‘espiões’ que o algoritmo usa para definir o preço para você?
Para definir o preço, a IA se alimenta de uma quantidade impressionante de informações, que vão muito além da simples oferta e demanda.
- Comportamento da Concorrência: O algoritmo monitora os preços dos concorrentes em tempo real e pode ajustar os seus para se manter competitivo.
- Histórico de Navegação e Compra: Ele sabe se você já visitou a página de um produto dez vezes, sinalizando alto interesse e, talvez, uma maior disposição a pagar.
- Dispositivo e Localização: Acessar um site de um celular de última geração ou de um CEP em um bairro de alta renda pode, teoricamente, indicar um maior poder de compra e levar a um preço sutilmente diferente.
- Horário e Clima: O preço de um ar-condicionado pode subir em um dia de calor extremo, e a tarifa de um carro de aplicativo dispara em um dia de chuva na hora do rush.
- A Polêmica do Perfil Individual: A prática mais controversa é a precificação personalizada, onde o algoritmo cria um preço específico para você, baseado em todo o seu histórico.
Onde essa tecnologia já está mudando os preços que vemos?
A precificação dinâmica não é o futuro, já é o presente em muitas áreas:
- Passagens Aéreas e Hotéis: O exemplo mais antigo e conhecido, onde os preços mudam de minuto a minuto.
- Aplicativos de Transporte: O famoso “preço dinâmico” em horários de pico é a forma mais explícita dessa tecnologia no nosso dia a dia.
- Grandes Sites de E-commerce: Gigantes do varejo online alteram os preços de milhões de produtos várias vezes ao dia para competir e maximizar as vendas.
- Supermercados Físicos: Esta é a nova fronteira. Com o uso de etiquetas de preço eletrônicas nas gôndolas, um gerente pode alterar o preço de um item em toda a rede com um único clique, em resposta a uma promoção da concorrência ou a uma mudança no estoque.
Isso é justo? O que a lei diz sobre preços personalizados?
A precificação baseada em fatores de mercado (como demanda e estoque) é, em geral, legal. No entanto, a precificação personalizada discriminatória – ou seja, cobrar mais de uma pessoa com base em seu perfil de renda, localização ou qualquer outro dado pessoal – entra em uma área cinzenta e pode ser considerada uma afronta ao Código de Defesa do Consumidor e à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que exige transparência no uso de dados pessoais. O grande desafio para o consumidor é provar que essa discriminação ocorreu.
Como um consumidor pode ‘driblar’ os robôs e encontrar o melhor preço?
Não se trata de lutar contra a tecnologia, mas de usá-la a seu favor.
- Navegue em Modo Anônimo: Ao pesquisar preços, especialmente de voos e hotéis, use a janela anônima do seu navegador. Isso impede que o site use seus cookies para rastrear seu interesse e potencialmente inflacionar o preço.
- Use Comparadores de Preços: Antes de qualquer compra online significativa, utilize ferramentas e sites de comparação de preços.
- Limpe seus Dados: Apagar os cookies do seu navegador antes de uma nova busca também pode ajudar a “resetar” o preço que o algoritmo mostra para você.
- Abandone o Carrinho: Uma tática conhecida. Se você não tem pressa, coloque o produto no carrinho de compras online e feche o site. Muitas empresas, notando o abandono, enviam um e-mail horas ou dias depois com um cupom de desconto para incentivar você a finalizar a compra.
A era do preço fixo na etiqueta está chegando ao fim. Em um mundo de preços fluidos, o consumidor mais bem preparado não é o que foge da tecnologia, mas o que a entende. Ao pesquisar, comparar e proteger seus dados, você retoma o poder de decisão e garante que está fazendo o melhor negócio possível.









